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domingo, março 13, 2011

O problema da precariedade

É ser uma bandeira que esconde mais do que mostra.

Creio que ficou claro, apesar das tentativas de apropriação de uma certa esquerda, que o que unia os manifestantes deste passado sábado não era apenas, ou sobretudo, a questão da precariedade laboral.

Se alguma coisa unia a diversidade de manifestantes, a julgar pelas imagens televisivas - e são essas as que marcam, goste-se ou não, o significado das manifestações -, era o descontentamento com um regime, no sentido de sistema, que lhes defraudou as expectativas.

É este também o meu sentimento, de há muito tempo para cá. Foi por isto que estive tentado a participar. Não o fiz, porque me venceu a sensação de que o essencial seria a reclamação de "empregos seguros"; enganei-me...

De facto as pessoas aproveitaram esta primeira oportunidade genuína, no sentido em que seria extra-partidária, para manifestar o seu desencanto com o rumo do País e, porventura mais ainda, com o estado a que o País chegou.

Estas três décadas e meia de democracia viveram da promessa do "direito ao emprego" e de uma certa tentativa de igualização, no sentido de igualdade sócio-profissional. Pediu-se às famílias para mandarem os filhos para as universidades com a promessa implícita de que encontrariam empregos seguros. Pior ainda, depreendia-se dessa promessa que era indiferente o curso escolhido; qualquer que fosse, logo se encontraria o almejado emprego seguro.

Já todos percebemos que não é assim, nem nunca será, apesar do que possa continuar a pedir uma certa esquerda.

Porém, creio, há uma fonte deste descontentamento generalizado que ainda é mais profunda e que, por isso mesmo, nos une ainda mais. A da imoralidade instalada.

Todos temos consciência de que há uns quantos para quem a coisa continua a melhorar e é cada vez mais fácil; temos consciência de que as diferenças entre uns e outros se têm vindo a agravar e por isso é que a "desigualdade" atinge níveis terceiro mundistas, em Portugal; temos a sensação que o Estado e os nossos impostos são usados para objectivos que não se percebem nem se compreendem; temos a intuição de que enquanto nos pedem sacrifícios, continuam a usar a receita fiscal para insistir nos erros e nas apostas do passado, que nos trouxeram até aqui... etc, etc.

Creio ter sido este o verdadeiro motor da diversidade de participantes nas manifestações. Sabemos que a coisa está mal, não estamos contentes com a falta de oportunidades, e sabemos que a precariedade é apenas um sinal desse mal estar.

Num certo sentido, este foi o momento em que Portugal gritou: Não sabemos por onde vamos, mas sabemos que não vamos por aí!!!

Creio que estão criadas as condições para convencer os portugueses que a solução não pode ser a de continuar a prometer "direitos" - ao emprego, à educação, à saúde, às reformas antecipadas, etc, etc. Creio que está na altura de começar a prometer um caminho.

Sempre acreditei que a democracia-cristã era o caminho: liberdade económica e regulação estatal; separação entre economia e política; reforço das instituições e separação dos "poderes"; apoio aos mais carenciados e recompensa do mérito dos mais capazes.

O congresso do CDS aproxima-se rapidamente. É altura de propor um caminho alternativo, sem hesitações e com clareza. Conscientes da dimensão dos desafios e seguros do valor das nossas soluções.

É possível um Portugal melhor. Basta querer!

quarta-feira, março 31, 2010

Paciência de Job

A minha mulher, a minha filha e eu embarcámos em Bruxelas, no dia 27 de Março, no voo TAP 603 com destino directo ao Porto. O aviãozeco da Portugália vinha cheio. Chegados ao Porto, informam-nos que as nossas 3 malas não tinham vindo. Entretanto apercebemo-nos que outros 8 passageiros ficaram igualmente sem malas e que alguns deles haviam reparado, ao entrarem no avião, que estavam a retirar para o lado algumas malas, em vez de as carregarem no porão.

Passaram mais de 24 horas sem que os serviços da Groundforce do aeroporto do Porto tenham dito o que quer que seja, embora saibam que essas malas ficaram em Bruxelas « porque o avião estava com excesso de pêso ». Quando os contactei, disseram-me que não podiam garantir nem assegurar que as malas viessem no dia seguinte ou depois. Diga-se de passagem que a telefonista do aeroporto Sá Carneiro tem instruções precisas para não passar qualquer chamada para a Groundforce e que os passageiros só podem contactar um serviço call-center em Lisboa, o qual também não dá quaquer informação. Só depois de muita insistência minha, explicando que estou fora do Porto e que tenho medicamentos nessa bagagem e que preciso de informações mais rigorosas é que a menina aceitou passar-me alguém da Groundforce.

Ou seja, apesar do contrato que fizemos com a TAP, apesar de termos respeitado os limites de pêso da nossa bagagem, apesar das taxas aeroportuárias altíssimas que nos exigem, alguém arbitrariamente e unilateralmente decidiu escolher umas tantas malas para ficarem no tarmac de Zaventem, sem nada nos dizerem ou prevenirem, e depois tratam-nos no destino desta forma. Estivemos encalhados em Penafiel, agarrados ao telefone a tentar contactar fantasmas e call-centers, num percurso de combatente para tentar encontrar um interlocutor que nos desse uma informação ou uma esperança e ninguém assume responsabilidades ou, pior, todos se escondem atrás de respondedores automáticos ou nos recusaram n°s de telefone em Portugal ou em Bruxelas para sabermos o que se passava.

A minha mulher diz filosoficamente : « chegámos a Portugal ». E diz tudo.

quarta-feira, março 17, 2010

Liberdade de expressão e rolhas

A propósito deste mais recente imbróglio santanista, no PSD, parece-me que cumpre esclarecer algumas ideias.

Ninguém é obrigado a ser membro de nenhum partido. Aliás, como ninguém é obrigado a nada a não ser pagar impostos; e mesmo aí, nem todos pagarão o que devem...

Quando alguém, voluntariamente, escolhe ser membro de alguma organização, naturalmente adere às regras por que se rege essa organização. Nomeadamente as regras de intervenção e de recato.

Ninguém terá dúvidas disso mesmo, no que respeita, por exemplo, às regras de confidencialidade aplicáveis nas organizações laborais. Sejam organizações de que tipo forem, privadas ou públicas, terão sempre regras dessas, que toda a gente respeitará, sob pena das mais graves sanções, nomeadamente o despedimento - com a única e pública excepção dos tribunais e da magistratura, que, embora as tenham também, não as compreendem, nem aplicam, por razões políticas ou outras; essas justiciais violações, que podem afectar direitos individuais seriamente, não alteram o essencial, que é a existência das regras e a necessidade do seu cumprimento.

Não lembrará a ninguém falar de "violação da liberdade de expressão", ou muito menos da liberdade de opinião, por causa de regras desse tipo.

Do mesmo modo, não se vê em que medida uma decisão de uma organização partidária, de expulsar um seu membro por se pronunciar em termos considerados inoportunos, em época de campanha eleitoral, possa ser uma "violação" do tipo descrito. Primeiro, porque a sanção é ridícula: expulsão do referido partido, no caso mais grave. Depois, porque os partidos, mesmo o comunista, têm órgãos próprios que permitem aos seus membros expressar-se "livremente" (embora isso possa ser questionável, no caso dos comunistas portugueses) quando e onde é oportuno. Finalmente, porque se a discordância é assim tão séria, não há nada que impeça uma pessoa verdadeiramente livre de expressar a sua opinião, quaisquer que sejam as circunstâncias. Como o demonstram todos os presos políticos no Mundo. Como já não há, felizmente, em Portugal.

Portanto, o que estará aqui em causa é outra coisa. Provavelmente, como escreve Rui Tavares no Público de hoje (aliás, sob o sugestivo título de "A aberração"), o que está em causa é uma certa concepção de autoridade e de disciplina.

E é aqui que discordo fundamentalmente do que escreve Rui Tavares, assim como discordo do que a generalidade dos comentadores têm escrito sobre a matéria - incluindo o nosso douro, em post disponível algo mais abaixo.

Primeiro, porque não há qualquer superioridade moral em ser libertário, por oposição a ser autoritarista, ou filosoficamente autoritário, como lhe chama Rui Tavares.

Segundo, porque defender a autoridade, e a disciplina - partidária, clubística ou outra qualquer -, não é nenhum defeito, por muito que essa seja a opinião dominante no momento actual. Especialmente em Portugal. Como vemos e sabemos pelo que se passa nas escolas nacionais.

A autoridade é um elemento importante de qualquer sociedade complexa e organizada. Pode ser bem exercida ou mal. Mas é fundamental a sua existência, assim como é decisivo o respeito pela autoridade. Seja ela natural ou "por força de lei", como será o caso de muitos impreparados agentes da "autoridade".

Poderia até afirmar que a forma como uma sociedade cultiva, impõe e defende o respeito pela autoridade é um sério indicador do seu nível de desenvolvimento... mas deixo essa defesa para outras núpcias.

Terceiro, porque a discordância com o líder e a cúpula partidária pode ser muito relevante e revelador do estado do próprio partido, mas não é, pelo menos numa democracia pluripartidária funcional, a expressão máxima, única ou sequer decisiva da "liberdade de expressão" - e menos ainda da liberdade de opinião! A sua expressão, sobretudo em épocas de campanha eleitoral, é acima de tudo um sinal de indisciplina. E um motivo de fofoca - que, receio bem, é a verdadeira razão porque a nossa imprensa confunde esta regra com um ataque à liberdade de expressão e, pior ainda, de opinião...

Finalmente, porque, independentemente do que pensem os auto-denominados libertários, o respeito pelas regras, nomeadamente as que defendem a autoridade e a disciplina, são uma condição da sofisticação social - as sociedades evoluídas não tem menos regras do que as outras, bem pelo contrário; o que não quer dizer que todas as regras são impostas pela força, muitas delas são-no apenas pela "força" das convenções sociais (mas isso é outra conversa).

Outro aspecto, paralelo mas conexo com este, é reconhecer que em Portugal nem se respeita a autoridade, nem a autoridade se dá ao respeito - frequentemente. E portanto, sobre disciplina estamos conversados.

Dito isto, repito o que me motiva: não vejo o que tem esta regra da "rolha" social-democrata de tão extraordinário. Mas como o País anda sem norte, tudo é possível... até confundi-la com ataques às liberdades fundamentais da expressão e da opinião.

O que essa confusão representa é o desrespeito mais básico pela liberdade individual e a correspondente responsabilidade: só é membro de um partido quem quer e, naturalmente, quem quer deve saber respeitar as lideranças legitimamente escolhidas. E combatê-las onde é próprio, quando oportuno e pelos canais próprios - canais esses cuja existência, essa sim, implica o respeito pelas liberdades de que aqui falamos; o que quer dizer que a sua eventual inexistência é que representa uma violação das ditas liberdades. Aí é que as coisas são sérias!

O que também sei é que o exercício dessas liberdades é hoje claramente punido; nas promoções nas carreiras, nos convites para os lugares, etc. etc. Hoje premeia-se a fidelidade, não se respeita a independência, de opinião ou outra, e confunde-se lealdade e lisura com a dita fidelidade - partidária ou outra. E disto, ninguém fala...

Essa é que é essa.

É possível um Portugal melhor. Mas é preciso querer.

PS. Para não me acusarem de coisas inconfessáveis, aqui me assino: Francisco Meireles