A Yanira tem trinta e tal anos, mas aparenta bem mais de quarenta.
Quarenta falsos anos que carrega como um fardo tão pesado quanto a distância que a separa dos três filhos há mais de seis anos. A mais nova tem 7 anos, deixou-a em El Salvador ainda bébé. Morreram os pais e o marido e ela pôs-se ao caminho para poder cumprir um velho sonho: ter os filhos na Universidade.
Os olhos rasgados, escuros e tristes, transformaram-se quando disse, em Catalão e perante toda a turma, em voz baixa e por entre sorrisos de insegurança: o meu filho mais velho formou-se de Ingeniero o mês passado; a minha segunda filha estuda para ser Enfermera.
De manhã, a Yanira (que na verdade, segundo me explicou, devia chamar-se Janira, mas a tia enganou-se quando a foi registar e fez um Jota que parecia um Ypsilon, então ficou) toma conta de uma senhora velhinha que adora. “Es muy cariñosa…tengo que levarla bajo el brazo para pasear porque és muy fragil”. Às tardes, trabalha à hora em casas que precisem dos seus serviços. Agora tem duas tardes livres – essa patroa mandou-a embora, recusou-se a dar-lhe a última hora do dia para o curso de Catalão – “a tarde toda ou nada”.
Ela precisa deste curso “para los papeles”. Perdeu duas tardes de trabalho. A minha nova amiga leva o curso muito a sério, guarda religiosamente todo o material e usa cada bocadinho livre do caderno – já lhe disse que não é preciso tanto, que assim não se percebe nada, mas ela diz que tem medo de chumbar e de precisar de mais caderno para repetir.
Ontem tivemos que fazer uma composição. A Yanira escreveu a dela de forma tão empenhada que partiu o bico do lápis três vezes. No fim, pediu-me para a corrigir, antes de entregar à professora.
Estava tudo certo, menos uma palavra, no feminino, que eu não percebi se acabava em “a” ou em “o”. A resposta dela foi sublime: “Ana, eu só tenho a 2a classe. Às vezes não sei bem como escrever uma palavra, se é com “a” ou se é com “o”. Então faço uma coisa assim-assim…dá p’rós dois lados.”
(continua ali)
Ana
Não sei lá como é, mas a verdade é que toda a família escreve bem...
ResponderEliminarEste postal bebe-se num só trago, que é um regalo!
bjs
J
A Ana não é parente, embora seja como se fosse da família.
ResponderEliminarSomos todos irmãos em Cristo, como diz o padre de Brito, Guimarães
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