terça-feira, janeiro 20, 2009

A segurança e as liberdades

A justiça penal do mandato Bush ficou marcada por uma série de exageros e atropelos dos direitos humanos como os que vimos em Abu-Ghraib. No dia em que se inicia o mandato de um presidente americano em que se depositam tantas esperanças – eu deposito, embora cada homem seja muitas vezes a sua circunstância, e não se possa saber ao certo quais as circunstâncias com que Obama vai poder contar – pergunto-me que evolução irá ter o direito e o processo penal da América, e que influência ela poderá vir a ter no nosso velho Continente. O mandato Bush caracterizou-se pela necessidade de combater o terrorismo e os riscos de ataque contra bens jurídicos fundamentais dos cidadãos, instaurando uma espécie de estado de guerra penal, que levou a tratar como “fora da lei” aqueles que representassem um risco para a segurança do Estado e dos seus cidadãos. Em Julho – com o voto a favor de Obama - foram ampliados os poderes de investigação governamental pelo FISA, (Foreign Intelligence Surveillance Act) que já existia desde 1978, mas que passou a permitir de forma muito mais ampla, sempre que se verifique risco para a segurança nacional e com base numa causa provável de crime, a realização sem aviso prévio e sem necessidade de autorização judicial, de escutas telefónicas, leituras de emails e buscas, sendo que o processo na maior parte dos casos corre perante um tribunal secreto, e não permite recurso das decisões proferidas. Não há dúvida de que os perigos que nos rodeiam em matéria de terrorismo e de outro tipo de criminalidade como os tráficos de armas e de pessoas, são imensos, e que se legitima reforçar o combate e a reacção a esses riscos, mas ao mesmo tempo não só se sabe como em matéria de risco tudo é arriscado e presumido (lembram-se do Fiel Jardineiro em que todos os indícios apontavam num sentido e afinal a conclusão era outra?), como o estabelecimento de presunções de perigo directamente associadas a certas pessoas ou a certos grupos também permite a sua perseguição e a sua exclusão, e representa um outro grave risco que é o fim da tutela de certas liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas como a conhecemos. Até que ponto estamos dispostos a sacrificar um dos lados da balança? Benjamin Franklin afirmava que aqueles que são capazes de sacrificar as liberdades essenciais para obter uma segurança temporária não merecem nem a liberdade nem a segurança. Mas Benjamin Franklin também não se defrontou com um ataque às torres gémeas que custou milhares de vidas, ou com o ataque à estação de caminho de ferro de Atocha na vizinha Espanha que tirou a vida a duas centenas de pessoas e fez quase dois mil feridos…

2 comentários:

  1. Obrigado por este Post Paula.
    É bom ler alguém que junta os conhecimentos técnicos e a humildade, problematiza sem certezas absolutas.
    Eu dúvido tantos das certezas absolutas...
    Bom ano!

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  2. Obrigada! Fico contente por ter gostado! :-) E faço também meus os votos de um bom ano de 2009!

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