Várias considerações me suscitaram dúvidas perante os resultados eleitorais. A primeira foi tentar perceber quais foram as profundas escolhas do eleitorado. Para o entender melhor, elaborei o seguinte quadro, com base nas informações do excelente www.legislativas2015.pt:
A primeira conclusão que me parece evidente é que o PS não foi o principal beneficiário do castigo que os eleitores deram ao Governo e aos partidos que o apoiam, como foi sublinhado por todos os observadores; mas... (há sempre um mas), mais importante parece-me ser a seguinte conclusão, também apoiada nos mesmos resultados: se atribuirmos ao CDS um resultado proporcionalmente semelhante ao que obteve em 2011 (cerca de 23,24% do total da coligação), verificamos que o PS e o PSD ficariam em empate técnico, com cerca de 1,7 milhões de votos cada (e ligeira vantagem para o PS).
Ou seja: se por um lado a estratégia de concorrer coligado permitiu uma vitória (de Pirro?) aos dois partidos que apoiam o Governo, por outro lado se os partidos tivessem concorrido todos separadamente (e os resultados da coligação se tivessem mantido em proporção, o que não é liquido pois não seria surpreendente que o PSD tivesse sido menos penalizado que o CDS), seria de facto António Costa o vencedor, ainda que com um resultado fraco; ou possivelmente Pedro Passos Coelho, mas sem a possibilidade de formar governo só com o CDS...
O que me leva à segunda conclusão que também deveria ser evidente: o que os portugueses verdadeiramente quiseram foi um governo do Centrão, que aliás perdeu menos votos do que o Governo (10,26% a menos, comparado com a perda de 25,86% da PaF). A minha intuição diz-me que o queriam com PPC como primeiro-ministro, mas isso nunca saberemos...
Naturalmente, esta possibilidade de um governo do Centrão ficou prejudicada pela sageza do CDS (ou de Paulo Portas), quando impôs a coligação, garantindo que faria parte do futuro governo, mesmo que fosse liderado pelo PS... Ou assim parecia!, pois António Costa parece ter trocado as voltas a muita gente. Apesar de se poder também argumentar que o atual CDS também pertence ao Centrão, e portanto que esta opção seria mesmo a mais legítima (pois até aumenta a votação em 2,74%)!
Terceira conclusão: o crescimento da Esquerda extrema (aquela que tem assento parlamentar e não endossa o consenso que reune o centrão ou o arco da governação: UE, Euro, Nato, etc.), não foi assim tão espetacular comparado com o do PS (embora em percentagem tenham crescido 36,4% e o PS apenas 11,45%, em votos, cresceram pouco mais do que o PS: 266.047 votos contra 179.517).
Ou seja, mesmo que isto permita sustentar a grande vitória (em termos de crescimento) do Bloco e do PCP (marginalmente), a verdade é que é difícil disputar a liderança à esquerda de António Costa.
Finalmente, registo ainda que apesar da diminuição dos votos brancos ou nulos (11,38%), o grande beneficiário foram os pequenos partidos (os que não tinham representação parlamentar) que além de terem elegido 1 deputado pelo PAN, cresceram 62,86% (quando a Esquerda extrema "apenas" cresceu 19,38%).
Ou seja, parece-me que ainda estamos muito longe da "podemização" ou "syrização" do eleitorado português...
E esta última conclusão TEM de ser importante para quem, à esquerda, pretenda formar/apoiar a formação de um governo alternativo... pois implica que pode, e talvez deva, haver alteração de políticas, mas implica igualmente que NÃO pode haver ruptura de políticas!!!
Note-se que PS e PSD mantém 61,84 do total de votantes (contra 66,7 em 2011). O que confirma a legitimidade dos líderes dos dois partidos para formarem governo, com os apoios que encontrarem no Parlamento, mesmo que não se queiram entender os dois como parece ter sido a vontade do eleitorado (por causa do CDS estar umbilicalmente ligado à coligação?!?).
Numa palavra: não me parece que esteja em curso um golpe constitucional, ou de estado, ou seja o que for que se lhe quiser chamar... António Costa está apenas a fazer uma leitura utilitarista dos resultados eleitorais - e perfeitamente normal em países habituados a governos de coligação.
O que não impede que o PS, através de António Costa e da eventual coligação/acordo à esquerda), possa estar a preparar uma inversão da política nacional, com a proposta ruptura com as políticas do Governo ainda em funções. Essa sim, creio, é a grande questão para o futuro de Portugal.
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