Tenho sempre uma espécie de pavor quando me
arrastam para assuntos de moral. Prefiro conversar sobre ética, mas às vezes a
fronteira esbate-se e ouço afirmações peremptórias e absolutas cuja certeza não
sou capaz de partilhar e sobre as quais prefiro assumir uma ignorância prudente
ou uma dúvida que até pode parecer cobarde.
Vai um exemplo?
Quando o Mouzinho de Albuquerque aprisionou em
Chaimite (1895) o régulo Gungunhana, foi este acompanhado pelas suas 7 mulheres, pelo
filho mais velho e por outros dois personagens na viagem que os trouxe em
condições abjectas para Lisboa, onde são encarcerados nas casamatas da
prisão de Monsanto.
Como à volta daquele Forte se tivesse
instalado um arraial de populares que todos os dias ali se deslocavam para
vislumbrarem no pátio as “bestas”, e porque começavam a multiplicar-se nessa
feira zaragatas e distúrbios, decidiu o governo de então desterrar o grupo para
a ilha Terceira. Mas porque o facto da poligamia do prisioneiro incomodasse o
moralismo católico da época, resolveram as autoridades separar as mulheres, as
quais viriam dias depois a ser deportadas para a ilha de S. Tomé, onde a
maioria viria a morrer na mais profunda miséria.
Gungunhana, o filho e os outros foram desterrados
para os Açores, mais precisamente para o Castelo de S. João Baptista de Angra
do Heroísmo. O Governador local, dando-se conta da tristeza e da saudade profundas
de Gungunhana, intercedeu junto do Governo de Lisboa para que ao menos fosse
autorizada uma das mulheres a vir viver com ele, mas nada feito. Em vez disso, foram
dadas instruções oficiais para que aqueles homens fossem levados todas as
semanas a um bordel da cidade onde se poderiam aliviar das suas mágoas e não só.
E assim se salvava a moral e os bons costumes.
Como exemplo, dá que pensar. Ou não?
Moral da história: a ética evolui com a História...
ResponderEliminarFRF
Onde está a ética e onde está a moral?
ResponderEliminar(se eu fosse cristão talvez vislumbrasse alguma...)