quinta-feira, fevereiro 14, 2013

Uma história mal picada


A carne de cavalo que temos comido pensando tratar-se de boi é uma pontinha do iceberg da indústria alimentar europeia. Se as diferentes autoridades nacionais começassem de verdade a analisar os pratos cozinhados, as latas de salsichas, as conservas de carne, os congelados, as sopas e os doces que alegremente nos vendem pronto-a-comer nos supermercados seria um susto colectivo e uma náusea generalizada.

É certo que nada indica que estejamos ao nível da China ou da Rússia, onde abundam produtores de alimentos que envenenam consciente e sistematicamente as populações. Na Europa isso também acontece, como foi o caso do falso azeite espanhol  ou dos óleos de garagem que acabaram na cadeia alimentar dos belgas, mas é menos frequente. Onde nós somos especialistas é na fraude: dar gato por lebre e ao preço desta.

A boa consciência europeia salva-se impondo uma infinidade de regras de etiquetagem e de rotulagem que aumentam na proporção directa da diminuição do tamanho das letras na embalagem. A minha mulher leva uma lupa quando vai às compras mas invariavelmente tem de explicar-se a algum fiscal de prateleiras que julga que ela anda a lamber as latas.

 
Este escândalo começa a incomodar. Ao princípio foi fácil: apontou-se o dedo aos romenos que, era evidente, estavam por detrás desta vergonha. Mas a cada dia que passa percebe-se que não só aqueles nada fizeram de ilegal ao cumprirem uma encomenda de carne de cavalo que como tal exportaram, mas que em França, no Reino Unido, na Alemanha, na Holanda, enfim, nos mais respeitados Estados-Membros da União sai dos matadouros carne de burro ou de cavalo ( se calhar também de cão) como se se tratasse de carne de porco ou de vaca. Com a agravante de que, apesar de toda a gente dizer que não se trata de um problema de saúde pública, ser muito provável que a maior parte desses equídeos tenha sido tratada com anti-inflamatórios altamente tóxicos para o homem.

Pode ser que entretanto alguém se lembre de ir dar também uma vista de olhos pelos produtos que se apresentam como sendo bio ou eco. Ah pois, se é preciso saber a história toda, ao menos que no-la contem de uma vez, que o nosso estômago aguenta. Ai aguenta, aguenta...

9 comentários:

  1. Já me tinham dito que há duas coisas que não interessa saber como são feitas: as leis e as salsichas.

    Um abraço

    JAC

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  2. Aqui em Dakar os cavalos andam na rua a puxar carroças. Mas os talhos (na estrada!) têm carne vermelha e duvido que seja toda de vaca. Mas uma coisa é certa, qual é a diferença entre carne de vaca, cão, crocodilo, periquito? Desde que não seja humana, carne é carne! E se for processada e bem temperada nem se nota. Os Chineses nesse aspecto são bem mais abertos!

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  3. Aqui em Dakar os cavalos andam na rua a puxar carroças. Mas os talhos (na estrada!) têm carne vermelha e duvido que seja toda de vaca. Mas uma coisa é certa, qual é a diferença entre carne de vaca, cão, crocodilo, periquito? Desde que não seja humana, carne é carne! E se for processada e bem temperada nem se nota. Os Chineses nesse aspecto são bem mais abertos!

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  4. Muito bem Francisco
    Mesmo quando não estou de acordo (o que não é o caso agora) é sempre um grande prazer ler o que escreve.
    Um abraço
    AM

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  5. Caro Gama, a Comissão Europeia decidiu hoje, 14 de Fevereiro, autorizar que as douradas e outros peixes das chamadas "quintas de mar" sejam alimentadas com farinhas de carne animal. O que pensa disto? Será um exemplo de abertura de espírito ou mais uma patifaria cujas consequências são imprevisíveis? No pior caso, quando se constatar a versão "peixes loucos", nem o Barroso nem os outros comissários estarão lá para se responsabilizarem. Outra coisa: a carne humana também é carne, ou julga que não? Aonde é que a gente põe um limite? O Gama era capaz de fritar uma costoleta do seu cão? Eu não era capaz de comer o meu, mas percebo que seja por não ter abertura de espírito. Mas se calhar era capaz de comer um bife do seu, se estivesse esfomeado e não houvesse alternativa. Se sair de Dakar, vai encontrar por essas picadas uns miúdos a vender à borda da estrada ratos do campo que são considerados um petisco. Experimente; abre-lhe ainda mais os horizontes . Bote-lhe muita pimenta e un pós de gengibre. Bom apetite e um abraço.

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  6. É boa essa das quintas do mar. Eu até como peixe-galo. Mas quanto ao cavalo marinho, sou incapaz.
    Um abraço
    JAC

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  7. Caro Douro. Eu não como carne há 2 anos, não consigo. E se as douradas de "aviário" passarem a ser alimentadas dessa maneira também deixo de lhes tocar. O mundo agradece. Abraço

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  8. desgraçado do alimal que passa a goela de outro alimal. Essa é que é essa. ab Zé G

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  9. Como diz Pierre Rhabbi, a nossa alimentaçao tornou-se tão toxica que, quando nos sentamos à mesa, em vez de "bom apetite" deviamos desejar-nos "boa sorte"!
    MG

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