terça-feira, julho 01, 2008

Obras públicas e TGV

Frequentemente se fala do TGV português, pelo menos na blogosfera, como um erro. Agora, o PSD veio questionar a oportunidade do investimento, com o argumento mal amanhado dos problemas sociais. Do que raramente se ouve falar é das alternativas.

Primeiro, do meu ponto de vista o principal problema social do País é o da falta de moralidade. Enquanto os partidos que querem falar de social não falarem do problema da moralidade, não convencerão ninguém. Não quero cuidar disso agora, pelo que me limitarei a dizer que a tão propalada mudança de paradigma da economia portuguesa, ainda não assumiu a sua consequência mais urgente: há priviligiados em Portugal que beneficiam mais do que seria normal e há excluídos que não são compensados pelos prejuízos que essa mudança os faz pagar. Enquanto se não enfrentar este problema de frente, não há possibilidade de animar a malta para um novo projecto de País.

Do que aqui quero cuidar é do problema das obras públicas que queremos (?!) fazer. Como demonstra bem o mapa aqui um pouco mais abaixo, o problema da miragem do TGV, como aliás também do NAL (novo aeroporto de Lisboa, para os mais incautos), é de facto o da sua oportunidade. Não estará em causa se o País precisará um dia de TGV. O que importa é saber se não haveria outras obras públicas mais urgentes.

Em minha opinião, claramente, há outras obras mais urgentes. Sobretudo no transporte ferroviário.

Não sou um especialista de transportes, mas também não é preciso sê-lo para perceber que aproveitamos mal os nossos portos de mar. A nossa posição geográfica, normalmente apontada como de perificidade, tem como grande vantagem acessória a sua proximidade de importantes rotas marítimas internacionais, que o poderiam facilmente tornar numa importante porta de entrada de mercadorias para a Europa. Obviamente, perante o que já sabemos hoje sobre o que será o mundo de amanhã, só e apenas se soubermos investir adequadamente em meios de transporte adaptados a esse mundo de amanhã. No caso das mercadorias, isso implica obrigatoriamente investir na ferrovia. É esse o caminho urgente das obras públicas.

É esse também o problema do TGV. Justamente porque nos desvia a atenção da urgência da modernização da nossa rede ferroviária, muito especialmente a virada para o potencial exportador da nossa economia e particularmente para a reconstrução, reinvenção de uma nova centralidade dos nossos portos de mar, para os percursos internacionais de mercadorias. À escala da Península Ibérica, em primeiro lugar, e da primeira porta da Europa em segundo.

No actual estádio do País, o problema não é deixar de fazer obras públicas; o problema é fazê-las com a inteligência suficiente para permitir que se façam primeiro as que mais depressa se podem rentabilizar (numa relação óbvia de custo-benefício). Ganharia o País todo.

E para que não se diga que não há propostas concretas, aqui ficam algumas.
Primeiro, a opção clara de transformar a linha que vai ligar Lisboa a Madrid, numa linha mista que permita o verdadeiro tráfego de mercadorias - e não as fantasiosas esperanças quiméricas em que a RAVE funda as projecções de mercadorias para as linhas de Alta Velocidade - e assegure a ligação prioritária de Sines a Madrid (sem duplicação de linhas).
Segundo, a aceleração e prioritização da ligação a Medina del Campo, a partir de Aveiro e pela Guarda, em linha de velocidade elevada mista, obviamente, se possível, se não pelo menos em bitola europeia.
Terceiro, a concretização da linha Porto-Vigo, em velocidade elevada já chega (e permite que seja também mista), se possível com desvio de Valença para Ourense, para permitir o melhor e mais rápido escoamento das mercadorias.

É possível um Portugal melhor. Basta querer.

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