“Tenho conhecimento da minha obrigação de encaminhar grávidas que solicitem a interrupção da gravidez para os serviços competentes, dentro dos prazos legais”. Este é o teor da declaração que têm que assinar os médicos que pretendem invocar a objecção de consciência para não realizar abortos, e que é, no mínimo, espantoso. O direito à objecção de consciência traduz o reconhecimento pelo Estado de que há situações e momentos em que a lei não pode impor a obrigação de actuar neste ou naquele sentido às pessoas, sob pena de desrespeitar decisões fundamentais, e de pôr em risco o que as define como seres humanos. E esse reconhecimento da parte do Estado existe, porque não está em causa uma decisão qualquer, nem se trata do exercício de uma liberdade qualquer. Normalmente, trata-se de situações limite de conflito onde pela natureza das coisas, dos interesses em causa, das próprias circunstâncias internas das pessoas, é sabido que fica em causa uma liberdade de consciência inviolável, se quisermos, uma liberdade mais funda, ou “maior” do que as restantes. Ora, não deixa de ser curioso constatar como a nossa sociedade foi magnânima no espaço que resolveu deixar à liberdade da mãe que decide terminar com a vida do filho e que não precisa de motivo para se fundamentar, e se pretende agora impor ao médico objector de consciência que invoca uma liberdade essencial, a prática de actos que revelam o reconhecimento por ele da legitimidade do aborto a pedido, violando em toda a linha o conteúdo e a essência desse direito. Por maioria de razão, se as mães não têm que justificar actos que atingem bens jurídicos manifestamente superiores, porque têm os médicos objectores que cumprir deveres relacionados com a lei que rejeitam, e que os leva a invocar a objecção de consciência, se se trata de uma liberdade primordial e fundada? Não há dúvida de que a nossa sociedade anda a calibrar bem pesos e medidas, direitos e obrigações…
"...e pretende agora impor ao médico objector de consciência que invoca uma liberdade essencial, o reconhecimento da obrigação legal de fazer o aborto a pedido, violando em toda a linha o conteúdo e a essência desse direito..."
ResponderEliminarSem querer sequer analisar com maior profundidade o resto do texto, todo ele merecedor, no mínimo, de vivos reparos, fico-me apenas por esta parcela, para questionar (a quem, eventualmente, conheça a autora):
Trata-se de desonestidade intelectual em estado puro, ou tão somente a simples ausência da mais elementar capacidade de discernimento?
António Moreira
O médico que invoca a objecção de consciência não reconhece a obrigação legal como vinculante e a lei dá-lhe esse direito. Esse é o sentido da objecção de consciência. O que não quer dizer que a obrigação legal não exista em geral.
ResponderEliminarFiquei a pensar na objecção, mas sinceramente acho, que embora se possa defender que o dever de encaminhamento para outro serviço é um dever lateral que nada tem a ver com a objecção de consciência em si que se refere exclusivamente á prática do facto, a verdade é que o dever de enviar a mulher para outro serviço não pode recair sobre quem rejeita de forma fundamental a realização do acto. Isso esvaziaria muito o conteúdo da objecção de consciência que a lei reconhece. Esse dever só deveria recair sobre os serviços e o médico teria que assinar simplesmente uma declaração de recusa de proceder ao aborto. E não preciso que digam por mim que desonestidade, seja intelectual, ou de outro género, é exercício que não pratico.
ResponderEliminarNestas coisas ou se tem uma bo aparceira ou então uma boa mão.
ResponderEliminarAgora 3 mãos ao mesmo tempo é um bocado permissivo.
Mas, prontos... por mim tudo bem desde que a mão seja feminina
"“Tenho conhecimento da minha obrigação de encaminhar grávidas que solicitem a interrupção da gravidez para os serviços competentes, dentro dos prazos legais”. Este é o teor da declaração que têm que assinar os médicos que pretendem invocar a objecção de consciência para não realizar abortos..."
ResponderEliminar(parei a citação antes das palavras seguintes "nos hospitais", para não vir a ser acusado de estar a "pegar" em mais uma inconsistência do seu texto...)
"...E não preciso que digam por mim que desonestidade, seja intelectual, ou de outro género, é exercício que não pratico. "
Fica então claro que se não é desonestidade intelectual, será apenas falta de discernimento, cara Paula.
Então eu, com muito gosto passo a ajudar.
Da leitura que faço(haverá outras possíveis?) trata-se apenas de garantir que o médico que (no seu direito) resolva assumir o estatuto de objector, nesta matéria, não vai (se calhar levado por algum tipo de fundamentalismo "moral") esconder da mulher, que tem todo o direito de exercer a opção que a lei lhe permite (pense lá o sr médico objector o que pensar).
Ou seja faz com que o médico exerça a sua OBRIGAÇÃO de dizer a VERDADE, encaminhando a mulher para os serviços competentes dentro dos prazos legais.
A objecção garante apenas que o médico objector não é obrigado a realizar IVG, não lhe dá o direito de tentar criar obstáculos às mulheres que, no seu legítimo direito, o pretendam.
Será que é assim difícil de entender?
AM
Não me parece que faça sentido impôr ao médico objector o dever de informar a mulher dos seus direitos. A mulher tem o direito de fazer a IVG mas ao médico objector, como objector, apenas lhe deverá ser pedido que declare que por razões de consciência não está em condições de a fazer.
ResponderEliminarSobre o ter falado de hospitais dando a ideia de que a objecção se poderia restringir aí, tem toda a razão. Se há objecção, ela tem que ser sempre objecção, e dei uma falsa ideia do que penso. Vou corrigir.
"O médico objector tem o direito de informar a mulher das alternativas ao aborto."
ResponderEliminarFalta lá esta frase, para que seja legítimo pôr "..e tem o dever de informar quem faz abortos"!!!
é completamente ilegítimo tentar isolar um médico objector, já que apenas uma minoria dos portugueses se manifestaram activamente a favor do aborto.
Há três alternativas para um médico objector de consciência:
ResponderEliminar1.Perante o pedido da mulher para realizar o aborto, cala-se e nada diz. Fica mudo. O que me parece pouco ético e talvez até falta de educação e de sensibilidade para com a mulher.
2.Perante o pedido da mulher,mente-lhe e diz-lhe queo aborto é sempre ilegal.Para descansar a sua consciência.
3. Perante o pedido da mulher,diz-lhe tem o direito de interromper a gravidez até às 10 semanas, eu não o farei porque sou objector de consciência.Procure outro médico e pense bem na sua decisão e nas consequências que ela trará para si. Não me parece,sinceramente, que esta terceira alternativa viole a liberdade de consciência dos médicos, podendo até levar amulher a reflectir mais na sua decisão. Não exagerem os movimentos do não e os objectores.Não adianta nada meterem a cabeçana areia.
Não adianta continuar a argumentar com quem, claramente, gostaria de, por via legal, poder impôr aos outros os seus valores.
ResponderEliminarEstou de acordo com o comentário do último anónimo (que não era eu :-))
António Moreira
Imaginem só Jesus Cristo, se fosse médico, que figura faria?
ResponderEliminar"A César o que é de César, a Deus o que é de Deus"!
Os problemas de liberdade e de consciência são de um melindre e de uma profundidade inesgotáveis.
Daqui a 50 anos o problema talvez ganhe novas cambiantes...
Eu anónimo me confesso: não sou o leitor António Moreira
ResponderEliminarNem poderia ser. Eu seria incapaz de escrever
"Não adianta continuar a argumentar com quem, claramente, gostaria de, por via legal, poder impôr aos outros os seus valores."
a propósito da posição assumida por AM. A não ser que a referência fosse feita a propósito dele próprio.
Não obstante, importa referir que - tirando os casos de normas sem carga valorativa como é o caso p.e. do Código da Estrada - uma norma legal contém sempre uma opção de natureza valorativa, ética. Nesse sentido, o que mais há é a imposição, pela maioria, dos seus valores aos outros (à minoria). Lamento o desapontamento que esta constatação possa causar.
E como isto é livre, quem não concorda pode dizer que não concorda. Com a calma e a serenidade da Paula, apesar do nervosismo do AM.
Trata-se de emitir opiniões, no campo de uma discussão racional. Acontece é que é frequente, à mingua de argumentos, vir com a história de querer "por via legal impor aos outros os seus valores". Como se isso fosse raro ou estranho. Repare, AM, que a minuta da declaração de objecção é para ser imposta aos médicos objectores.
João Anacoreta
Eu anónimo me confesso: não sou o leitor António Moreira
ResponderEliminarNem poderia ser. Eu seria incapaz de escrever
"Não adianta continuar a argumentar com quem, claramente, gostaria de, por via legal, poder impôr aos outros os seus valores."
a propósito da posição assumida por AM. A não ser que a referência fosse feita a propósito dele próprio.
Não obstante, importa referir que - tirando os casos de normas sem carga valorativa como é o caso p.e. do Código da Estrada - uma norma legal contém sempre uma opção de natureza valorativa, ética. Nesse sentido, o que mais há é a imposição, pela maioria, dos seus valores aos outros (à minoria). Lamento o desapontamento que esta constatação possa causar.
E como isto é livre, quem não concorda pode dizer que não concorda. Com a calma e a serenidade da Paula, apesar do nervosismo do AM.
Trata-se de emitir opiniões, no campo de uma discussão racional. Acontece é que é frequente, à mingua de argumentos, vir com a história de querer "por via legal impor aos outros os seus valores". Como se isso fosse raro ou estranho. Repare, AM, que a minuta da declaração de objecção é para ser imposta aos médicos objectores.
João Anacoreta
Obrigada, João. Era isso mesmo que se queria dizer. Há a plena consciência de que a lei está feita e consagra uma determinada opção. É para cumprir. Mas também há uma lei que permite a objecção de consciência ao médico e cujo sentido tem que ser respeitado na íntegra...
ResponderEliminarO António Moreira (que apesar de ser, parcialmente, meu homónimo, nada tem a ver comigo), denota aquele sintoma que, por mais que uma vez, já tive a oportunidade de aqui denunciar. É quem mais reclama tolerância para as suas ideias e convicções, que menos a usa para com as ideias e convicções dos outros.
ResponderEliminarNa verdade, AM revelou ter nesta discussão a "tolerância" Trotsquista e o tom seminarista que caracteriza outro grande defensor da IVG e que, por acaso, também lidera um Bloco à Esquerda.
De resto, é como diz JAC, o facto da "minuta da declaração de objecção (é para) ser imposta aos médicos objectores" não tem qualquer problema para AM, pois afinal isso é apenas um pequeno "pecadilho" comparado com o facto de termos tido até há umas semanas atrás uma lei que LIMITAVA a possibilidade de uma mãe poder desfazer-se de um filho que gera...
Portanto, AM, ficamos a saber que para si as leis com que concorda podem "justamente" abalroar a consciência e o estatuto (também ele com previsão legal) de todos. As com que não concorda são grilhetas que carregamos e das quais temos que nos libertar. Contra quem quer que seja.
Acho que estão a ser injustos contra o AM. O Hospital de S. João já não aplicava a lei de 84 que permitia o aborto em três casos, lei com a qual os defensores do não em ambos os referendos maioritariamente concordaram... Agora não querem aplicar esta lei. Parece-me que por trás desta polémica é o que está em causa. Concordo com a objecção de consciência, também a faria no lugar dos médicos, mas não aceito boicotes à aplicação de leis com as quais a população concordou e que foram aprovadas na AR. Há crianças, já nascidas, a morrer,fisica e emocionalmente de maus tratos, e nunca vi os movimentos pró-vida protestarem publicamente contra isto. O que se ouviu quando a Vanessa apareceu morta no rio douro foi um padre dizer que é mais grave abortar do que espancar uma criança até à morte.
ResponderEliminarAo último anónimo :-)
ResponderEliminarNão se trata de alguns "comentantes" serem justos ou "injustos com o AM".
Todo o assunto nasce de um comentário de uma (decerto jovem) senhora que por claramente não ser (nem ter que ser) especialista em letras (eu também não sou) ter tido alguma dificuldade em interpretar um texto e, em vez de pedir ajuda a alguém mais capaz, achou que lhe ficava bem escrever umas linhitas sobre o assunto.
Claro que, em relação ao tema IVG, só há duas posições, a favor ou contra.
Como em quase tudo, para a generalidade das pessoas, se limita a duas posições, a favor ou contra, sim ou não, esquerda ou direita, porto ou benfica, por cima ou por baixo.
As pessoas que escrevem neste blog, são pessoas normais (vulgares, banais, etc.) por isso são assim, escolhem ser de "direita" , seja lá isso o que for, mas isso nem interessa nada, o que interessa é que a partir do momento que escolheram ser "de direita", para serem iguais aos outros do "rebanho" (bairro, escola, creche, igreja, modista ou cabeleireira) a vida está toda facilitada, não precisam mais de pensar ou de analisar os assuntos complexos (nem os outros) pois basta seguir as posições "da direita" e ir copiando uns argumentos que até podem não ter pés nem cabeça, mas não faz mal que eles não percebem.
Se continuo a acreditar que, no caso da senhora que escreveu o comentário, não se tratará de desonestidade intelectual, mas apenas falta de discernimento e compreensão do português, já no caso dum tal senhor José Anacoreta (que escreveu umas patetices aí a cima), estou certo que à falta de discernimento e à desonestidade intelectual se juntam outras características pouco abonatórias mas que decerto serão consequência de excesso de catequese.
ESTA GENTE DETESTA A DISCUSSÃO E O DEBATE DE IDEIAS e por isso faz os possíveis (normalmente insultando ou ameaçando) para correr das "suas" caixas de comentários aqueles que não se limitem a contribuir para o "debate interno da vida do partido"....
Alguns até, nestas caixas de comentários, afirmam-se como militantes do CDS-PP, e fazem-no não com vergonha, mas sim como se fosse algum motivo de orgulho...
Patético
Estou cansado de responder a gente desta, aproveitem então bem, por agora, pois já me vão faltando os "trocos"
António Moreira