Conhecidos os resultados da primeira volta das presidenciais francesas, começa-se a adivinhar o futuro. Um dos dois será o próximo presidente. Creio que ambos representam uma vontade da França em mudar, embora com tónicas diferentes e com políticas diferentes. Sarkozy promete mais, mas também encontrará seguramente mais resistência nas ruas, onde muita coisa é decidida em França. Royal teria certamente muito mais facilidade em implementar reformas, mas parece ter muito menos vontade de as fazer e vai ter muita dificuldade para mobilizar um número suficiente de eleitores. A seu favor tem sobretudo os receios que Sarkozy provoca, no plano interno.
Em muitos aspectos Portugal tem evoluído num sentido semelhante ao da França. As nossas maiores cidades degradam-se, permitindo o surgimento de guetos que são alfobres de inadaptação, revolta e violência. Uma grande parte do país torna-se subsídio-dependente, quer porque trabalha para o Estado quer porque deseja trabalhar para o Estado ou repetir no privado as condições que caracterizam o emprego público. As elites vivem em circuito fechado, trocando lugares entre amigos, defendendo para os outros soluções que consideram inconcebíveis para si próprios e para os seus próximos. Por outro lado, algumas empresas, com maior ou menor apoio do Estado, vão-se afirmando globalmente, com maior ou menor dificuldade, mas sempre contra o sentido do contrato social dominante. Uma parte dos cidadãos, gostaria de viver num sistema que premiasse melhor o mérito, em todos os sentidos - incluindo profissional e financeiro -, mas vê-se condenada quer pela outra parte, quer pelos interesses instalados, quer pela inércia e umbiguismo da elite, quer pela inadaptação do sistema político para encontrar as respostas porque anseia, ainda que subliminarmente, a maioria da população. Em países destes, é particularmente difícil promover reformas.
No que respeita à França, com franqueza, o problema é-me relativamente indiferente, a não ser num pequeno aspecto. O imobilismo francês está a bloquear o progresso europeu. E isso é mau para Portugal. Por causa deste aspecto, únicamente, preferia a vitória de Sarkozy. A sua vitória, em face das propostas que já apresentou, facilitariam em muito a ultrapassagem dos actuais bloqueios, ainda que pudessem "condenar" a Europa a assumir as chamadas "várias velocidades" (que, diga-se, muito boa gente considera já existirem de facto). Quanto ao mais, limito-me a esperar que o vencedor tenha coragem para fazer as reformas de que a França necessita. Creio que Sarkozy tem mais vontade de as fazer, mas confesso que não perco muito tempo a pensar nisso.
No que respeita a Portugal, espero que a vitória de Paulo Portas possa contribuir para que o País venha a ter uma maior consciência da dimensão das mudanças necessárias - e que decorrem do que afirmei acima. Paulo Portas tem vindo a sublinhar a necessidade dos partidos se adaptarem às mudanças da sociedade. Desejo com todas as minhas forças que isso signifique um apelo à necessidade de encontrar respostas para os anseios mais profundos dos portugueses e não apenas uma vontade de adaptar o discurso político às correntes de pensamento dominantes num determinado momento.
Portugal, como a França, precisa de liderança. A liderança só pode vir de quem tenha uma visão para o País, construída como um conjunto coerente de respostas aos principais desafios que o País enfrenta, sejam os mais imediatos da apresentação de alternativas às políticas do Governo, sejam os mais profundos da construção de alternativas ao modelo de desenvolvimento do País. Portugal está a perder o futuro. É nessa batalha, na conquista desse futuro que eu sonho que Paulo Portas se venha a concentrar. É para essa vitória que eu desejo que ele venha a conseguir mobilizar o CDS (e muito mais...).
PS- Creio que, apesar de tudo, o actual Governo tem conseguido recuperar para a actuação do Estado muita da seriedade mínima sem a qual não se pode confiar no próprio Estado - e tenho assistido a isso até pelo exercício da minha actividade profissional, pelo que não falo apenas pelo que sai na imprensa, mas muito mais por experiência própria, ainda que limitada.
Acho, também por isso mesmo, que este Governo merece uma Oposição digna desse título. Mas, na minha visão das coisas, fazer oposição não é opor-se ao Governo. É procurar melhorar as propostas e iniciativas do Governo, sabendo que é ao Governo que compete decidir. É apresentar alternativas às soluções de que se discorda e não apenas afirmar a discordância. É apresentar propostas nas áreas que necessitam de reforma e nas quais o Governo não assume a iniciativa. É, sobretudo, contrapor uma visão moderna, flexível e descentralizada ao pensamento centralista e dirigista, ainda que mais rigoroso, do actual executivo do PS. Esperemos que seja deste tipo a renovada oposição de que tem falado Paulo Portas.
Ah, não fiquei surpreendido com o resultado de Paulo Portas. Confirmou o que eu pensava: o actual CDS pertence-lhe; foi desenhado e pensado por ele. Reconheço que, por uns momentos, pensei que essa verdade estivesse a ser posta em causa pelo esforço de Ribeiro e Castro, mas as directas desmentiram-me. Esperemos que Paulo Portas saiba aproveitar para o seu CDS o muito de bom que Ribeiro e Castro lhe tentou transmitir. A bem da Democracia-Cristã. A bem de Portugal.
Tá-se mesmo a ver que é "esse" tipo de oposição que o Dr. Paulo Portas vai fazer ao Governo.
ResponderEliminarNão é Ele que diz com imensa fleuma: O Engº. Sócrates vai ter oposição.
E depois, ó caro "Ventanias", dar tanto ênfase às eleições presidenciais francesas como ao Dr. Paulo Portas, eu vou ali... e fico lá, porque de facto, não vale a pena voltar.
Questão de perspectiva, ó caro "acf". O ponto não é, como aliás não é em quase nada, a importância absoluta. A importância relativa, isto é, aquela que me diz respeito a mim (e a cada um de nós portugueses), essa talvez lhe explique o enfâse das duas questões... para já não falar nos problemas que enumerei.
ResponderEliminarUm abraço, para quando voltar de ir ali...
O segundo período do seu post, Ventanias, é de antologia. "Mas prontos..."
ResponderEliminarImporta-se de elaborar, caro douro?
ResponderEliminarÉ que o "mas prontos..." não é muito esclarecedor...
Caro Ventanias, não é preciso elaborar muito, basta ler o tal período e perceberá que se trata de uma palissada bem engendrada, embora lhe compreenda o contexto. O "mas prontos..." é um mero nariz de cera, a gozar, como quem diz "isto também não é muito importante". Passe bem e escreva sempre.
ResponderEliminar