sábado, outubro 19, 2013

INACEITÁVEL


INACEITÁVEL

De Angola chegam recados de rescisão de parcerias estratégicas, de Bruxelas “sugestões” para enfrentar a crise da dívida…enfim, ao que somos chegados! E não se trata aqui de manifestar um qualquer nacionalismo trauliteiro, nem de qualquer saudosismo serôdio do “orgulhosamente sós”….
Portugal vive em estado de dependência estratégica. Por causa da sua dívida “denotativa”, a soberana e o deficit corrente primário, e dos seus deficits “conotativos”: crescimento e desemprego. Somos chegados a um ponto exangue, a um estado de exaustão, a vários níveis, em que cada um tenta passar entre os pingos da chuva das medidas de austeridade.
Falou-se em retoma, em novo ciclo e, na verdade, há indicadores que, muito fragilmente, inverteram uma tendência negativa. Mas esses sinais dos indicadores  económicos, ainda que positivos, só poderão fazer adivinhar melhores dias, e não vão aliviar os difíceis desafios da economia real, nos próximos anos.
A tudo isto oferece-nos o Governo um Orçamento de Estado em que a palavra de ordem é o corte, o corte na despesa: pensões, salários. Dúvidas não existem de que é essa uma das soluções para o equilíbrio das contas porque o seu peso é, de facto, desmedido no deve e haver orçamental. A questão é: onde é que também se poderia cortar? Ou melhor, como é que os sacrifícios poderiam ser mais equitativamente distribuídos? Ora aqui a questão fica sem resposta. Onde está a famigerada reforma do Estado do Senhor Vice-Primeiro-Ministro? Onde está a coragem de afrontar as rendas pagas pelo Estado à EDP, às concessionárias rodoviárias, na saúde, etc.. Vejamos que o total de encargos do OE 2014 com PPP’s ascende a 1.645 mil milhões de euros (70% dos quais relativos às parcerias rodoviárias). Ora, já que falámos de PPP’s, e quanto ao sector empresarial do Estado? E no que toca o sector empresarial Local, que segundo notícias, o passivo ascende a 2,3 mil  milhões de euros? Aliás, onde é que o Estado mexeu na Administração Local? Porque é que o mapa autárquico camarário não foi beliscado? Onde para o Livro Verde da Reforma da Administração Local? Enfim, onde estão as medidas que, muito embora não solvessem as dívidas do Estado, pelo menos dariam uma imagem de equidade nos cortes? Não, não estão. E não estando não permitem que cada cidadão intua e aceite o seu devido valor.
Por isso a este orçamento falta legitimar-se, tendo ficado para trás a mais importante medida: apontar um caminho!
É demagogia…é com certeza. Porque só os cortes em custos fixos salariais poderão fazer uma diferença substancial e que perdure. Mas como nos dizia Victor Hugo: “Le peuple donne son sang et son argent, moyennant quoi on lemène. Un guide lui est nécessaire". Tudo o resto é despiciendo. Ora é este pormenor, é esta "demagogia" que faz a diferença entre aceitar mais e mais austeridade ou dizer basta! O detalhe, aqui, legitima!
E, como o problema é todo o mesmo, cereja em cima do bolo, crê o Estado e o Governo que o povo não assimila mais austeridade. E apoquenta-se com os remoques vindos de Angola ou os puxões de orelha de Bruxelas…! A bem do investimento e das finanças públicas e privadas. Tenho, contudo, para mim, que a nação pode estar as perder os anéis, mas ainda tem os dedos. E se anda a vender as jóias, não acredito que queira vender a alma! Por isso, para tudo há limites e estas insinuações e as interferências de que estamos a ser objecto são i-n-a-c-e-i-t-á-v-e-i-s para um Estado que ainda se quer soberano.  
Dirão umas almas sensatas que este não é caminho. Que isto do caso de Angola são "fait-divers" e que de Bruxelas são meros reparos. Perfeito! Mas o certo é que nós ouvimo-los e…ficamos sempre sem resposta, acatando os pareceres e remoques. Pergunta-se, porquê? Eis, pois, a questão!

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