sexta-feira, maio 04, 2012

"O que só um Deus pode fazer"

Sei que a dor é um assunto privado. Não se deve olhar para a dor alheia, ou comentá-la, quando muito ajudar, quando se pode, que na maior parte dos casos se pode pouco, ou nada. Mas há dores mais públicas do que outras. E também há dores que nos sensibilizam mais do que outras, porque embora iguais dizem respeito a alguém por quem temos particular simpatia. Queria aqui lembrar a dor e a preocupação do Miguel Esteves Cardoso pela doença da mulher. Sempre gostei de o ler, nas considerações sobre as manias e o modo de ser dos portugueses, nas descrições das pequenas alegrias da vida e do que é verdadeiramente nosso como a andorinha, o nosso café, o galão e o cozido, e sei que o seu regresso à escrita depois de uns anos mais escuros se ficou em muito a dever à Maria João. Que eu não conheço, mas de que ele fala a todos os momentos, e que faz parte de todos os seus artigos mesmo que não a cite uma única vez. A Maria João foi operada de novo, agora ao cérebro, e o Miguel Esteves Cardoso pediu a Deus, ainda esta semana, em carta aberta, que fizesse o que só um Deus pode fazer. Sinceramente não sei o que cabe nas atribuições de Deus. Temo que Deus, na sua infinita sabedoria, se afaste muitas vezes no desempenho do seu ofício daquilo que nós mortais gostaríamos que Ele fizesse. Mas se me é permitido desejar, tomara que Deus lhes permita voltar ainda este Verão à Praia das Maçãs...

1 comentário:

  1. A dor foi uma escolha nossa, colectiva ... Veio no mesmo "pack" da autonomia e da autodeterminação que reclamamos e reclamámos ... Teremos que viver com ela (e também contra ela) porque faz parte do pacote que, voluntariamente, escolhemos. Mas não é um assunto privado - basta ser uma experiência universal. Mas é pessoal, intransmissível; não se pode sofrer pelos outros, ninguém pode sofrer por nós. Mas podemos aprender a viver com o sofrimento (se nos atrevermos) de forma humana, e ajudar os outros a viverem com ele, às vezes simplesmente estando lá, sem palavras (se formos capazes do silêncio). Parafraseando Mia Couto, para ser capaz do silêncio, é preciso treinar muito ...

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