sábado, junho 25, 2011

A questão geracional

Um dos pontos que mais interesse suscitaram no novo governo foi a declarada ruptura geracional. Os 47 anos de média de idades pode ser um sinal interessante, mas interessa-me muito mais a competência e a seriedade dos jovens ministros; felizmente, estamos bem servidos neste capítulo, no que realmente importa.
Sou insuspeito, por navegar nas 43 primaveras, nas dúvidas que alimento quanto a estes clichés. Se a juventude é motor de mudança, capaz de rupturas tantas vezes necessárias e potenciadora de novos paradigmas, não é ao mesmo tempo avisado arrumar nas prateleiras da história os sábios que pelo percurso de vida, pelo estudo, pela reflexão e pela experiência acumulada têm muito para dar ao futuro.
Será o meu lado conservador, a minha visão de continuidade e da riqueza do diálogo intergeracional, mas defendo a convocatória dos mais experientes e do seu contributo para o desenho do nosso futuro colectivo.
Vem isto a propósito da crónica interessantíssima de Nelson Motta hoje no Estado de S. Paulo, que abaixo transcrevo. Vem isto a propósito de me ter lembrado de imediato, por exemplo, de Adriano Moreira e de Eduardo Lourenço.
O novo governo é de altíssima qualidade, acredito francamente nisto, mas não poderá deixar de convocar e ouvir aqueles que melhor pensam Portugal ainda que de gerações diferentes, os anos bem vividos trazem cabelos brancos e rugas e muito valor acrescentado.


"Poucos brasileiros chegaram aos 80 anos com o prestígio, o reconhecimento e as homenagens que recebeu o professor Fernando Henrique Cardoso. Nem adversários políticos, nem mesmo Lula, ousaram dizer que ele não os merece. Sem botox nem cabelos pintados, sem falsa modéstia, o homem está com a bola cheia, em excelente forma física e intelectual, ao contrário do companheiro Raúl Castro, que fez 80 e se diz com corpinho de 70, mas diante de FHC está uma ruína.
Nenhum político da oposição sequer se aproxima do peso e da altura de Fernando Henrique, nem da lucidez e clareza de suas ideias, amadurecidas pela vivência da realidade, geralmente estúpida e mesquinha, da política e do poder.
Ninguém tem mais autoridade do que ele na oposição, nem merece tanto respeito, e até temor, da atual base governista. Além disso, continua elegante, articulado e agudo em seu discurso, sem perder o humor e a (auto) ironia. Está mais simpático e relaxado, e até se permite generosidades e tolerâncias da maturidade. Hoje não haveria melhor candidato da oposição à Presidência da República.
Em 2014 ele terá 83 anos. Mas, com os avanços da ciência, a expectativa e a qualidade de vida crescem em proporção geométrica, há cada vez mais homens e mulheres lúcidos, vigorosos e produtivos nessa faixa etária, além de naturalmente mais sabidos, pela experiência adquirida.
Deng Xiao Ping, que viveu até os 95, governou até os 86 e deixou como legado as grandes transformações que resultaram na China moderna. Konrad Adenauer foi chanceler da Alemanha do pós-guerra até encerrar o seu histórico mandato com 87 anos. O marechal Tito governou a Iugoslávia com mão de ferro até os 88.
No Brasil há exemplos como o centenário Oscar Niemeyer, que nos seus oitentas estava em pleno vigor e criatividade. João Havelange,95, presidiu a FIFA até os 82, e, pela forma em que está, poderia estar lá até hoje. O presidente Venceslau Braz (1914-18) viveu até os 98.
Se o governo Dilma se arrastar até 2014, que espetáculo seria ver Fernando Henrique e Lula se enfrentando cara a cara em debates sensacionais. A eleição é só um pretexto. "

Sem comentários:

Enviar um comentário