sexta-feira, maio 27, 2011

Paulo Portas e o CDS

Ao contrário do entretanto transferido José Manuel Durão Barroso – que sabia que ia ser primeiro-ministro, só não sabia quando – Paulo Portas, o actual líder do CDS (antigo PP), sabe que vai fazer parte do próximo governo, só não sabe é com quem. Ou talvez não – vide as inflamadas, surpreendentes e laudatórias declarações do socialista Francisco Assis sobre Pedro Passos Coelho – mas isso serão avatares a seguir lá mais para a frente. Seja lá no que for que dêem as prometidas e nunca assumidas coligações pós-eleitorais, o certo é que Paulo Portas é destacadamente o grande vencedor da primeira semana de campanha eleitoral – lugar que, aliás, vinha ocupando desde o período da pré-campanha. O líder do CDS (antigo PP) preparou-se bem: desde logo, calou o que de melhor há em si (a facilidade intelectual com que defende pontos de vista extremos) e recentrou o partido numa direcção mais ‘eleitorável’: muito menos liberal e muito mais democrata-cristã, aumentando assim o segmento-alvo a que se dirige. Perde alguns incondicionais do liberalismo mais desabrido, mas ganha a massa de povo que fica com uma lágrima ao canto do olho sempre que encontra um pobre.


Por outro lado, Paulo Portas mostrou inegável mestria enquanto os responsáveis do FMI andaram a passear por Portugal, na tentativa de radiografarem as suas mazelas, descobrirem as suas fraquezas e desvendarem os seus estigmas. Não fez como o Bloco de Esquerda e o PCP – que se escudaram numa pouco feliz e levemente mal-educada recusa em irem ao seu encontro, como se não fizessem parte deste mundo e não demonstrasse bem mais coragem política irem dizer-lhes pessoalmente que não estavam interessados nas suas soluções. E principalmente não fez como o PS e o PSD – que transformaram o final de cada reunião com a ‘troika’ numa espécie de arena de vaidades saloias e num esgrimir de musculatura partidária que, salvo melhor opinião, não têm, nem tão pouco era para ali chamada. Inversamente, Portas assumiu-se como um dos parceiros das negociações e não andou todos os dias a deitar foguetes com as suas soluções, como se o FMI (e restantes comandos externos) não passasse de um impertinente vizinho que teima em vir regar as plantas do nosso próprio quintal.

No entretanto, o líder do CDS (antigo PP) decidiu uma agenda política (a sua própria agenda política) de que não é fácil fazê-lo desviar-se, o que, em termos de passar a mensagem política é ideal: não se dispersa para temas onde as suas declarações poderiam estar mais desenquadradas; não entra em discussões intermináveis sobre minudências capazes de criar bons ‘sound bites’ para os 15 segundos dos telejornais mas deixam os eleitores perdidos na contemplação do caos; nem responde a todas as provocações que lhe são lançadas, dando nota de que, para ele, a campanha eleitoral não é um combate de boxe de onde o adversário tem de sair como se fosse de debaixo de um camião TIR.

Com o povo a gostar do que ouve e o partido a subir nas sondagens, Paulo Portas tem pela frente – como nenhum outro partido – um horizonte de serenidade: sendo um parceiro de coligação em potencial tanto para o PS como para o PSD, está numa posição em que ambos os partidos preferem desfazer-se entre si que colocar em causa essa potencialidade. É como se Paulo Portas fosse ao mesmo tempo ‘caddie’ de dois jogadores de golfe que se detestam e estão preparados para se desfazer mutuamente sobre o ‘green’, contando que não dêem cabo do rapaz que lhes transporta os tacos. Melhor que isto é impossível. Até porque – sendo isto verdade – o povo já teve oportunidade de assistir a bizarrias tão inesperadas como Pedro Passos Coelho a assumir as dores de Paulo Portas na questão do sempre difícil dossier dos submarinos, não apenas na tentativa de lhe retirar ónus políticos, mas também de relativizar o excesso de despesa (como sucedeu há umas semanas na Faculdade de Economia da Universidade do Porto). Ou seja: Paulo Portas nem sequer tem de se defender, porque verdadeiramente ninguém o ataca.

Finalmente, sendo um partido pequeno, Portas não tem que andar a dizer boçalidades com carácter urgência: não precisa de andar pelo país a dramatizar que o CDS (antigo PP) precisa de ganhar as eleições, que precisa de uma maioria absoluta, que precisa do que quer que seja.

Porque verdadeiramente, nestas eleições, Paulo Portas não precisa de nada: está serenamente à espera de ser chamado para onde terá de ser chamado, enquanto contempla sob uma luz que imagina celestial o desmembramento dos seus adversários políticos.


Por Ernesto Serna

1 comentário:

  1. Meu caro Ernesto, eu não diria melhor. E tudo isto me parece digno de elogio. Como é justo, como é diferente e como relança alguma esperança neste mar de desilusão!!!

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