terça-feira, dezembro 08, 2009

Reciprocidade? Foi o que disse?

À pala dos quatro minaretes suíços, que um referendo helvético decidiu que não seriam construídos, desencadearam-se algumas paixões.

Nem a comunidade judaica nem a comunidade muçulmana têm uma presença no nosso país que provoque atritos ou irritações especiais e essas mesmas comunidades, cientes da sua "menoridade", cosem-se pelas paredes e andam de pantufas, satisfeitas de que mal demos por elas. Mas os tempos sendo o que são, é natural que as polémicas que se vivem noutros espaços europeus também mexam com o nosso sentir e soprem sobre os nossos princípios.

O islamismo (bem como o judaísmo) é uma religião tão europeia como o cristianismo. As três compõem o que poderíamos chamar de religiões do ocidente, os monoteísmos mediterrânicos, por antinomia às religiões verdadeiramente orientais, como o hinduísmo, o budismo, o taoísmo e as suas variantes. De alguma forma, o judaísmo está teologicamente mais próximo do islamismo do que do cristianismo, cuja noção de Jesus como filho de Deus lhes era absolutamente inaceitável.

Partilhámos com outros europeus, embora nem sempre nas mesmas épocas ou com a mesma virulência, um anti-semitismo identitário que serviu essencialmente para cimentar uma noção de "nós". Ora, anda por aí uma islamofobia que mais parece um 'remake' daquela necessidade antiga de nos distinguirmos do "outro". O debate lançado em França sobre o que é ser francês bebe nesta ideia de que a afirmação de um povo ou de uma nação se faz pela negativa (não sou isto, não sou aquilo, não sou aqueloutro).

É óbvio que um país tem as suas leis e todo o cidadão lhes deve cumprimento. Seria, todavia, desastroso que, à pala de uns minaretes cuja legalidade ninguém põe em causa, se perca a alma, ou, dito de outra forma, se esqueçam os princípios democráticos da livre convivência e respeito pelo outro.

As recentes declarações (ler aqui) do cardeal Jean-Louis Turain, presidente do Conselho pontifical para o diálogo inter-religioso, soam equívocas quando ele fala na necessidade de reciprocidade de tratamento. Estas matérias não se enquadram em negociações de reciprocidade porque são, a meu ver, questões de princípios e de cultura. Não se troca um campanário por um minarete: que se construa este mesmo se algures proíbem aquele.

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