quinta-feira, março 12, 2009

Os cornos de Moisés


A imagem de Moisés, tal como foi representada ou descrita ao longo dos tempos por pintores e escultores, tem dois cornos na cabeça. Porquê?

A Bíblia hebraica, ou seja, incluindo o Antigo Testamento, foi originalmente escrita em hebraico ( o Novo Testamento foi escrito originariamente em grego) e só mais tarde foi traduzida em grego e ainda mais tarde em latim.

Em finais do século IV, o Papa Dâmaso I achou que se devia fazer uma revisão geral da tradução latina que havia sido feita por diferentes pessoas, tanto do Antigo como do Novo Testamento. Encarregou S. Jerónimo dessa tarefa ciclópica. E este não se fez rogado, meteu mãos à obra e conseguiu produzir uma nova versão latina integral da Bíblia que viria a ser conhecida como a "Vulgata" e reconhecida, durante séculos, como a versão oficial do Vaticano.

No que respeita ao Antigo Testamento, S. Jerónimo (Eusebius Hieronymus) baseou-se essencialmente na versão hebraica e aramaica de que dispunha e socorreu-se de um assistente que lhe traduzia as expressões em aramaico para grego e ele então comparava com outras versões gregas e finalmente decidia um texto definitivo em latim.

Ora foi num desses exercícios que, ao contar a parte em que Moisés desce do Sinai, S. Jerónimo comete um erro de compreensão e de tradução e escreve no latim que Moisés "…cornuta esset facies sua" (vinha cornudo) .

Na realidade, o Exodus 34:29-30 dizia que Moisés vinha com a face radiosa, resplandescente, mas S. Jerónimo confundiu os termos e fixou um texto em latim que perduraria séculos até que o humanismo renascentista e a curiosidade dos protestantes aclarou o que estava no texto original hebraico.

É muito mais tarde, portanto, que as imagens de Moisés deixam de o representar com cornos e, numa daquelas manobras de que o Vaticano tem o segredo, começaram a substitui-los por uns feixes de luzes, para a seguir os apagarem e lhe iluminarem todo o rosto.

Moral da história: tem de se ir às fontes, sem intermediários, e mesmo aquelas têm de ser apreciadas com rigor para as limpar de manipulações conscientes ou inconscientes.

douro

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