quinta-feira, novembro 22, 2007

Justiça e Imprensa. Esmeraldas da vida moderna

Como confirma uma interessante discussão ocorrida em comentários a um post anterior, há uma decisiva diferença entre a Imprensa (no sentido de comunicação social em geral) e a Justiça.

Felizmente que é na justiça que se tomam as decisões.


Infelizmente, a imprensa nem tem a noção do mal que nos faz.

O caso da Esmeralda é um caso triste, muito triste. Mas, porque somos humanos, por vezes acontecem tristezas destas e é necessário lidar com elas. A Humanidade aprendeu com os seus próprios erros que o melhor era não lidar com estas situações em privado. Por isso se inventou o sistema de Justiça e por isso se avançou para um sistema de Justiça Pública; quer dizer, onde o monopólio da imposição de sentenças é público.

Infelizmente, porém, nos tempos modernos a imprensa decidiu ser justicialista. Pega no que crê serem as convicções da maioria, erige-as em regras e impinge-nos as suas conclusões.

Nós, pobres coitados, que fazemos? JULGAMOS. Como o demonstram, com as melhores das intenções, quer a Clara Sousa - em defesa dos pais adoptantes - e o AFM - em defesa do pai biológico -, no debate aqui abaixo produzido.

O erro, meus caros, está precisamente nisso. Nós não conhecemos todas as circunstâncias do caso da Esmeralda; nem muito menos as consequências que advirão, ou adviriam, de qualquer decisão que seja, ou fosse, tomada. Sobretudo em relação à Esmeralda e ao seu futuro.

O que sabemos é que existe um sistema de decisão que prevê a tomada da melhor decisão possível, de acordo com as regras legitimamente existentes na sociedade, e a possibilidade da correcção dessa decisão, nos termos previstos nesse sistema. Disponível a todos. Acessível a todos. E seguramente capaz de tomar uma decisão melhor do que aquela que os litigantes pretendiam tomar por si próprios... a verdade é que se quer o pai biológico, quer os pais adoptantes, tivessem o interesse da criança à frente dos seus próprios interesses, certamente seriam capazes de encontrar por si próprios uma qualquer decisão que permitisse à criança não ser confrontada com rupturas; o problema, claro está, é que todos temos convicções sobre o futuro e sobre o que é melhor, para nós e para os outros. Por isso é que a decisão não pode ser tomada por nós.

A imprensa, se quiser fazer o seu papel, há-de contribuir para a transparência do sistema divulgando-nos os factos. Sem adjectivos e sem tomar partido. Há-de, assim, contribuir para a nossa formação, pelo menos na medida em que podemos aprender com as experiências dos outros, para evitarmos as mesmas asneiras, se a nossa vida nos vier a colocar em situações semelhantes.

Pela minha parte limito-me, como católico que sou, a tentar não julgar os envolvidos e a tentar não presumir que seria capaz de fazer melhor. E a dar Graças a Deus por não ter tido, ainda, que viver uma situação parecida.

Mas isso não me impede de concluir que esta imprensa nos faz um mau trabalho; até por nos pôr em situação de fazer juízos em causa alheia - a história do cisco no olho do parceiro, quando a nós nos prejudica uma trave...

É possível um Portugal melhor. Basta querer.

8 comentários:

  1. Tal como você, Ventanias, também eu tenho muitas dúvidas neste caso e poucas, embora algumas, certezas.

    Desde logo, é um facto que o pai (biológico, se assim fizerem questão) apenas soube da existência da criança após o nascimento desta e assim que soube que era sua filha nunca deixou de lutar por ela. Nesta altura a criança tinha meses de vida e não atingira a idade da consciência.

    É também indiscutível que se a criança trata e vê como pai e mãe o militar e a sua mulher isso deve-se apenas ao facto destes terem guardado a criança desde que esta tinha poucas semanas de vida, por meios ilegais, contra a lei, contra as decisões dos Tribunais, ludibriando as forças de segurança, ignorando o Ministério Público. Ou seja, o militar e a mulher foram sequestradores da criança de quem se intitulam pais de coração.

    O tratamento dado à questão pela Comnicação Social parece-me absolutamente vergonhoso e exclusivamente virado para a exploração e venda de sentimentos emotivos, totalmente desprovido de falta de rigor e de imparcialidade, tendente a uma campanha de desinformação e de julgamento sumário na praça pública, com sentença previamente anunciada.

    Num comentário a uma posta anterior escrita pelo Ventanias, em resposta à Clara Sousa, escrevi o seguinte: "Imagine que quando um seu filho tinha semanas de vida lhe era retirado. Ilicitamente, claro está, como aconteceu ao pai da Esmeralda. E imagine que durante 4 anos o seu filho aprendeu a tratar por Pai e Mãe o casal que ilicitamente dele cuidou (bem, concedo). O que a Clara Sousa acima disse foi que nenhum Tribunal teria direito a entregar-lhe a si, Mãe, o seu filho."

    Pois eu não só acho que tem o Tribunal tem esse direito, como tem o dever de o fazer.

    Desde logo porque como pai (e aqui penso que falo por todos) não admito sequer a hipótese de haver alguém que goste mais do meu filho que eu.

    Mas mais. Sem menosprezar a violência do periodo que a Esmeralda vive neste momento, sobretudo atendendo ela ter apenas 6 anos, não me acredito que daqui a 12 anos ela vá aceitar que o seu Pai, desde que ela tinha meses de vida, quer poder assumir essa condição de pai, que na realidade é, mas alguém não deixou. Isto ninguém compreende. E por isso, quando me vêm com o argumento de que o superior interesse da criança obrigava a uma decisão contrária à tomada, eu penso que é justamente o superior interesse da criança e da jovem que a médio prazo será que obrigava à decisão que foi efectivamente tomada.

    Por último, eu sei que vivemos numa época em que a nobreza do sentimento, por mais manipulado que seja, justifica tudo. Mesmo, como alguns defendem neste caso, o desrespeito pela lei. Ora, a História ensinou-nos que é exactamente assim que as sociedades se corrompem, quando as decisões deixam de ser tomadas com base na lei e passam a ser tomadas ad hoc, com base nas vontades pessoais.

    Mas se eu estiver enganado e se realmente pudermos escolher as leis que cumprimos e as que não cumprimos, digam-me, por favor, porque assim de repente sou capaz de lembrar de algumas que me apetecia não cumprir. Desde logo em matéria fiscal, por exemplo.

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  2. 1.º)

    a) Gostava de saber qual é o homem minimamente sensato que aceitaria a paternidade só porque a mãe da criança, com a qual teve uma relação ocasional lhe diz que vai ser pai;
    b) Como veio várias vezes referido na comunicação social, o pai da menina requereu a sua guarda ao Tribunal, logo três dias depois de ter sido notificado da paternidade, pelo que essa acção estaria já antecipadamente preparada;
    c) Se o casal tivesse tido em consideração o interesse da criança teria chegado facilmente à conclusão que o pai era a pessoa mais indicada para ficar com a menina e teria acatado as ordens do Tribunal;
    d) O casal que tem tido a menina à sua guarda não tem acatado as ordens do Tribunal e não a entregou ao pai, conforme a determinação do Tribunal o qual também não foi capaz de fazer cumprir a sua ordem e desde então passaram vários anos, por isso a menina tem hoje 5 anos;
    e) Qualquer criança está sujeita a um drama semelhante: deixar de repente os seus pais e passar a viver com outras pessoas, por exemplo se os pais forem vítimas de um acidente de automóvel e ambos morrerem;
    f) Com o passar do tempo a Esmeralda irá compreender a situação e não lhe vai faltar informação sobre o assunto, será que vai concordar com o rapto, a que esteve sujeita e que a impediu de ter vivido sempre com o seu verdadeiro pai que a queria?

    2.º)

    Ainda não há muito tempo foi julgada no norte do país uma mulher que raptou uma criança recém-nascida numa maternidade e tratou irrepreensivelmente dela durante cerca de um ano. Para aquela criança aquela mulher era a sua mãe e teve que mudar de família.

    A raptora tratou muito bem a menina e tem uma situação económica muito mais confortável do que a verdadeira mãe que é pobre, tem vários filhos e até já tinha dado um irmão mais velho para adopção. Lá por isso ninguém ousaria defender que a criança deveria ficar com aquela mulher porque seria melhor prá criança.

    Poderá argumentar que a menina a que me refiro tem apenas um ano enquanto que a Esmeralda tem cinco. Então se o rapto só tivesse sido descoberto passados cinco anos também seria conveniente que a menina permanecesse com a raptora POR RISCO DE TRAUMA E NO INTERESSE DA CRIANÇA?

    Antes me quero entre os burros!

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  3. comentário das 5:03 de "Zé da Burra o Alentejano"

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  4. Três argumentos racionais e legais a favor da permanência da Ana Filipa (Esmeralda nome de registo) junto da família cuidadora:
    1.ª) A lei permite que uma criança seja confiada à guarda de terceiros quando os pais, independentemente de culpa, ponham em perigo, por acção ou OMISSÃO a saúde, a formação moral, educação ou segurança da criança (art. 1918n.º 1 do código civil)
    2.º) Uma criança está em perigo quando os pais provocam o seu desequílibrio emocional (art. 3.º da LPP)
    3.º) Quando a lei recorre a conceitos indeterminados - como o conceito de interesse da criança - para tomar decisões, deve atender aos dados das outras ciências sociais, nomeadamente, a psicólogos e a pedo-psiquiatras. Os tribunais, como sabem, ouvem,peritos, em muitas questões que não são exclusivamente jurídicas e legais.
    4.º) Os pedo-psiquiatras que têm acompanhado a criança já se pronunciaram contra a entrega da criança ao pai biológico. Os relatórios médicos disponíveis já há alguns meses, atestam que a criança tem problemas de saúde mental, devido à situação de conflito, e por medo de perder as pessoas que vê como pai e mãe.
    5.º) Confiar a guarda a terceiras pessoas não é uma adopção. E sempre uma decisão provisória que não corta o contacto com a família biológica, e que permitiria, neste caso, tranquilizar a criança.
    6.º Há jurisprudência que reconhece que a família não são os vínculos meramente biológicos,mas laços afectivos, construídos no dia-dia.
    7.º) O pai biológico só perfilhou quando a criança tinha um ano. Ninguém lhe tirou a criança. Foi ele que não a quis assumir. As dúvidas quanto à paternidade, ainda que justificadas, não podem comprometer o futuro da criança. Não pode ser a criança a pagar o preço da vida sexual irresponsável dos adultos.
    8.º) O pai biológico nunca reclamou legalmente a filha. Quem intentou o processo de regulação do poder paternal foi o MP. E já tinham passado três meses depois da perfilhação, feita num processo oficioso, também intentado pelo MP.
    9.º) A lei permite que uma criança seja confiada para futura adopção,depois de três de manifesto desinteresse dos pais biológicos(art. 1978).
    10.º)Neste processo nem sequer está em causa uma decisão tão drastica como a adopção mas apenas a permanência da criança junto do daqueles que reconhece como pais.
    11.º) Não me ponho no lugar dos adultos neste processo. Não me comportaria como nenuhm deles. LEMBRO-ME DO QUE EU ERA COM CINCO ANOS,COMO AMAVA OS MEUS PAIS, E O QUE SENTIRIA SE ME ENTREGASSEM A OUTRAS PESSOAS. NUNCA FIZ, COMO CONCERTEZA, NENHUM DOS SENHORES OU SENHORAS QUE ME POSSAM ESTAR A LER, EXAMES DE SANGUE PARA CONFIRMAR A PATERNIDADE OU A MATERNIDADE DOS MEUS PAIS. POSSO TER SIDO TROCADA NO HOSPITAL, COMPRADA A UMA CIGANA, RAPTADA, MAS NUNCA JAMAIS SUPORTARIA QUE ME RETIRASSEM DA GUARDA DAS PESSOAS A QUEM EU COM CINCO ANOS CHAMAVA PAI E MÃE. MORRERIA EMOCCIONALMENTE. É o QUE VAI ACONTECER À ESMERALDA/ aNA FILIPA! NÃO SE ESQUEÇAM QUE A VANESSA E A CATARINA MORRERAM DE MAUSTRATOS POR SEREM ENTREGUES A PAIS BIOLÓGICOS QUE DESCONHECIAM. a ESMERALDA MORRERÁ EMOCIONALMENTE. POR MAU TRATO DO TRIBUNAL!
    Desculpem se ontem fui mal educada com o afm. Eu compreendo a vossa posição,na perspectiva dos interesses dos adultos.Mas não consigo compreender a desconsideração pelos sentimentos da criança. EU SINTO-ME A CRIANÇA. EU não contribui para as loucuras dos adultos, e amo as pessoas que de mim cuidaram.
    E os adultos que, neste processo irão sofrer mais, são aqueles que cuidaram da criança, não os pais biológicos. Imaginem que um filho vosso,afinal não era vosso filho biológico (descoberta através de exames de sangue) e que tinham que o devolver, por força de uma decisão judicial, aos pais biológicos, no dia 26 de dezembro. Como se sentiriam?

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  5. Meus caros, Clara Sousa, afm e anónimo:

    Como vêem, há bons argumentos para os dois lados, e v. já tomaram partido.

    Para além do simples facto dos v. post terem mais factos sobre o caso da Esmeralda do que aqueles a que tive acesso pela imprensa, sublinho o seguinte:

    O problema do tratamento mediático destes casos é precisamente o facto de nos levar a tomar partido, sem sermos partes interessadas e sem podermos resolver o problema. É isso que eu critico.

    Nada mais, nada menos.

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  6. Caro Ventanias, penso que você já terá reparado na grande dose de sintonia que temos no que toca às apreciações que fazemos da forma como a imprensa exerce de facto o seu papel.

    Não penso, porém, que você tenha razão quando diz no comentário que antecede que o problema do tratamento mediático é levar-nos a "tomar partido, sem sermos partes interessadas e sem podermos resolver o problema". Na verdade isso acontece, e depois? Que mal tem?? Se reparar, este blog é feito no essencial de tomadas de partido relativamente a assuntos que não dizem respeito a quem aqui
    intervém. E por aqui não vem mal ao mundo.

    O que me parece é que, precisamente porque o tratamento mediático dos casos fará com que terceiros tomem posição, esse tipo de tratamento deve ser rigoroso, como raramente é, isento, como quase nunca é, e portanto objectivo, ao contrário daquilo a que nos habituamos.

    Já agora deixe fazer uma distinção no que concerne à minha posição neste assunto. Eu tenho efectivamente uma opinião. Não só quanto à atitude da imprensa de um modo geral como quanto a este "Caso Esmeralda", em particular - sendo que por acaso tive a oportunidade de ler o Acórdão da Relação. Mas contrariamente ao que você diz, não fiz nenhum tipo de julgamentos. Pelo contrário, isso deixei para o Tribunal e não tive a arrogância de me substituir a quem teve acesso ao pleno dos factos E DA PROVA EFECTIVAMENTE PRODUZIDA, condições essenciais para qualquer julgamento.

    E este, quanto a mim, é o pecado capital da imprensa de hoje (se é que foi diferente noutra altura). Dá para o "julgamento público" apenas alguns factos, meticulosamente escolhidos, com vista ao resultado, também ele previamente escolhido.

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  7. Tem razão, caro AFM. Faltou-me, na dita frase, acrescentar: "tomar partido, sem conhecimento dos factos todos, sem sermos partes interessadas e sem podermos resolver o problema".

    Quanto ao que eu queria significar com isso, penso que ficou claro.

    Assim como estamos de acordo em quase tudo quanto afirma no seu post, com uma única, ainda que importante, excepção: eu não tenho opinião no caso Esmeralda - a não ser a de discordar com o "rapto" da menina pelo militar e sua mulher - nem muito menos sobre a bondade da sentença. Mas também é verdade que não tive oportunidade de ler o acórdão da sentença de qualquer das instâncias.

    Abraço sincero.

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  8. Cara Clara de Sousa
    O seu comentário não tem qualquer fundamento e até revela falta de conhecimento do caso...

    1.º)e 2.º) Em que se base ia para afirmar que o pai pode provocar desequilíbrio mental na criança?

    3.º) As opiniões dos pedopsiquiatras - Embora possa ser influenciada pelo casal adoptante, com o passar dos anos a Esmeralda irá ter a sua própria opinião crítica sobre o assunto. Será que vai concordar com o rapto, a que esteve sujeita e que a impediu de ter vivido sempre com o seu verdadeiro pai que a queria e que reclamou a sua guarda logo três dias depois de saber que era o pai biológico?

    Será que isso não lhe poderá provocar futuros traumas psicológicos? - Desafio os Srs. Psiquiatras pronunciacem-se sobre o assunto.

    5.º) e 6.º) Comentários sem conteúdo que mereçam resposta.

    7.º) A Sra. não leu ou não compreendeu o que disse na alínea a) - Referi: "...qual o homem minimamente sensato que aceitaria a paternidade só porque a mãe da criança, com a qual teve uma relação ocasional lhe diz que vai ser pai;" - O Istituto de Medicina Legal e depois o Tribunal levaram dodo esse tempo para fazer os testes de paternidade e depois para os comunicar ao pai!

    8.º) A Sra. não leu ou não compreendeu o que disse na alína b)- Referi: "...o pai da menina requereu a sua guarda ao Tribunal, logo três dias depois de ter sido notificado da paternidade, pelo que essa acção estaria já antecipadamente preparada;..."

    9.º) Diz bem: "Depois dos PAIS manifestarem desinteresse" e, como sabe, isso inclui o PAI que não manifestou nem manifesta desinteresse...As alínieas 7.ª) e 8.ª) são confirmam-no.

    10.º) A sua afirmação não faz sentido. Assim, quanto mais tempo o casal adoptante andar com a criança fugindo da justiça, maior será o direito em ficar com ela. Do mesmo modo, pode raptar-se uma criança (por exemplo numa maternidade). Se se só for descoberto apenas 6 anos depois, como a criança só conhece os raptores como seus familiares, a criança deverá ser-lhes entregues (?)

    11.º) Esta parte não tem que vêr com o caso da Esmeralda.

    Zé da Burra o Alentejano

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