Eu já estive em Angola a trabalhar duas vezes. Fui sozinha nos Outonos de 2005 e 2006, e da última vez fui detida à saída, no aeroporto de Luanda, porque me tinha esquecido de tirar dos bolsos das calças uns Kwanzas que não podem sair do país. O problema foi resolvido rapidamente à custa de dólares, mas escusado será dizer como me senti vulnerável e à mercê de um corpo policial muito pouco confiável. O mundo em Luanda divide-se em dois, mas se não fossem os grandes carros com vidros fumados a circular no meio da cidade, os restaurantes guardados por metralhadoras, certas zonas residenciais privadas e, evidentemente a Caras Angola, um visitante pouco atento de Luanda não daria conta de muito mais além da velocidade de reconstrução da cidade que é realmente impressionante – por todo o lado há estaleiros da Somague, da Soares da Costa, da Mota Engil, sedes fabulosas de multinacionais poderosíssimas, investimento asiático por todo o lado – e da miséria das pessoas, do número de mutilados que ainda há, do estado de degradação das casas, ou da insegurança terrível que não permite a um branco sair do hotel sem seguranças, ou chauffeur armado, sob pena de ser assaltado logo ali à porta, muitas vezes sob ameaça de armas tão precárias como o fundo partido de uma garrafa. Queria só contar um episódio que ilustra bem o que se pode ver das "traseiras" de um hotel de luxo, desses onde a Caras faz reportagens, mas onde não entra o cidadão angolano comum. Um dia, da janela do meu quarto, virada para um prédio em ruínas, não sei bem se destruído pela guerra, se abandonado em fase de construção, vi, no primeiro andar, uma meia dúzia de crianças entretida a tirar ratos de ratoeiras, e a metê-los em sacos de plástico. Estiveram nisto dez minutos, ou mais, nem sei bem. Sei que quando achava que a minha observação já estava a durar tempo demais para uma cena tão macabra, as crianças acercaram-se da beira do andar onde estavam, e entregaram os sacos a um grupo de mulheres na rua que os levaram com destino garantido. Mais longe da Caras Angola não podiam estar aquelas pessoas. Mas ela por lá continua a contar as suas verdades.
Paula,
ResponderEliminarImpressionante relato. Muito longe também do poema que escolhi para responder à corrente dos livros...
bjs e obgdo pelo desafio,
F
Obrigada Filipe. Já fui ver o poema e gostei muito. Um beijinho da
ResponderEliminarPaula
Paula,
ResponderEliminarO que tenho visto em Luanda nos últimos meses, onde me desloquei por várias vezes, é indescritível. Ainda assim, algumas imagens retratei-as, e estão no Blue Lounge, aqui:
http://blueloungecafe.blogspot.com/search/label/Luanda
Rodrigo Adão da Fonseca
É terrível a riqueza que aquele país tem e a pobreza em que vive a maioria da população. Se Angola, com as condições únicas que tem, não consegue aguentar-se, o que será com os outros países de África...?
ResponderEliminarJá tinha estado no Blue Lounge várias vezes, mas não tinha reparado nas fotografias de Luanda. Estão fantásticas. Obrigada.
Cara amiga.julgo que não conheces bem a verdadeira realidade desta angola..é triste tentares persuadir os outros..cá vivo há 30 anos e o meu cordão se encontra longe,mas conheço bem esta angola que marcha firme..porque nada dizes do brasil?que vergonha..porque nada dizes de portugal que sempre mendiga na cauda da europa..que tristeza.
ResponderEliminarse fosse eu o policia no aeroporto te punha de cana uns 7 dias.