Embora seja um optimista por natureza, não estou muito optimista em relação ao futuro das megacidades que temos andado a criar nas últimas décadas, em Portugal. Preocupam-me essencialmente duas coisas: a falta de qualidade de vida nos centros das cidades e a guetização dos grupos socio-económicos (isto é, a multiplicação de bairros sociais e de condomínios fechados, que promovem o isolamento e distanciação entre diferentes estratos sociais).
Não estou optimista porque qualidade de vida, nos tempos modernos, significa essencialmente acesso à mobilidade por automóvel e acesso a serviços de proximidade (cabeleireiros, barbeiros, cafés, cinemas, papelarias, tabacarias, etc.). O segundo depende da oferta de serviços e esta da existência de moradores. Estes não escolhem viver nos centros por causa do primeiro: não tem acesso a estacionamento prático, nem a vias de saída e chegada suficientemente descongestionadas. Portanto, os nossos centros estão naturalmente condenados a desertificarem-se.
O contrário, que seria desejável, exigiria políticas de RE-ORDENAMENTO, leia-se destruição de muitas asneiras, correcção de outras e introdução de melhoramentos radicais, para as quais os nossos munípios e seus políticos não estão preparados. A todos os níveis. O financiamento autárquico depende essencialmente do sector imobiliário; portanto é induzido a aceitar ou mesmo pactuar com o jogo da especulação. O essencial da especulação imobiliária é feito com muito pouco profissionalismo, pelo que os empresários preocupam-se apenas em maximizar o lucro de cada projecto (até se organizam juridicamente para esse efeito), sem se preocuparem com a sustentabilidade da sua própria actividade.
Acresce que o parolismo provinciano continua a imperar em muitas das cabeças governantes (não fizemos avenidas grandes no século XIX, vamos fazê-las agora, com os mesmos padrões, como se a sociedade do conhecimento não tivesse já chegado...; Lisboa tem, o Porto também tem de ter; o modelo de financiamento autárquico é inadequado mas não vale a pena tentar mudá-lo, etc. etc.).
Dito isto, declaro publicamente que quero lutar contra este estado de coisas. Por isso, sou contra o projecto da via Nun'Álvares estruturada como uma autoestrada urbana, ladeada por prédios em banda (como consta ser o caso).
O que significa que sou a favor de uma outra via, ampla, larga e atraente, concebida como uma alameda por onde se circula, a pé e de carro, com facilidade, com estacionamento adequado às valências que ali vierem a ser criadas e às já existentes, que assegure a rápida chegada a quem lá quiser vir e a fácil partida a quem lá viva; dotada de zonas de convívio (isto é, passeio, descanso e encontro), arborizada a condizer e atraente do ponto de vista comercial e de serviços, de preferência pensada para os seus residentes lá encontrarem o essencial dos serviços de que necessitam e possivelmente até o próprio emprego. Mas sobretudo pensada para os tempos modernos: nestes as pessoas vivem de carro e com o carro.
Façam torres se tiverem de as fazer, mas assegurem-se que essas torres não poluem visualmente a qualidade dos residentes (estacionamento suficiente, não serem em banda, permitirem luminosidade atraente - que é um dos principais trunfos nacionais) e financiam os serviços públicos adequados a atrair "qualidade de vida" (auditório, escolas, juntas, parques para avós e netos, etc, etc). Sobretudo prevejam que a qualidade futura só se assegura com planeamento de longo prazo, inclusive para os especuladores imobiliários.
POR MENOS DO QUE ISTO, NÃO VALE A PENA.
É possível um Portugal melhor. Basta querer.
Subscrevo totalmente! Há mts urbanistas que deviam fazer uns estágios na Holanda, para perceber como se deve fazer as coisas: tudo bem que a conjuntura socio-economica é diferente, mas há liçoes imporantes a tirar deste exemplo: o planeamento sustentado das várias zonas urbanas, com comissões de acompanhamento compostas tanto por moradores, empresas municipais e empresas construtoras: assim salvaguarda-se os interesses de todos, com DIÁLOGO e TRANSPARENCIA. Porque nem todo o grande projecto é mau só porque uma grande construtora pegou nele, e há sempre maneira de todos atingirem os objectivos (nem sempre totalmente, mas no essencial). Note-se que eu discordo da construção da dita avenida.
ResponderEliminarKito
Boa, meu caro.
ResponderEliminarTu tens a certeza que conheces Nevogilde, ou melhor, que conheceste Nevogilde antes dos prédios da Rua do Crasto e antes da construção de prédios abaixo do Largo da Igreja de Nevogilde (à Rua do Molhe)?!!!
ResponderEliminarNão sejas touço. Nevogilde já foi estragada qb...