Acabo de ouvir o "expresso da meia noite" sobre a Ota. Tirando a intervenção final do representante dos pilotos e as questões técnicas, que não são de menosprezar, levantadas pelo representante dos engenheiros, o debate foi, como tem sido hábito, de uma pobreza desconcertante.
A primeira questão, e porventura a mais importante para os portugueses, tem a ver com a localização. Não apenas nos arredores de Lisboa, mas no País. Não é preciso ler todos os estudos que estão disponíveis na internet para perceber que o principal argumento para afirmar que a Portela está esgotada é, pura e simplesmente, FALSO.
A capacidade da Portela, nos termos desses estudos, só se esgota caso a Portela seja o aeroporto plataforma (hub, em inglês) do País. Mas não há nenhuma obrigatoriedade de que assim seja. Pelo contrário, se se quiser ir mais longe na construção de um hub, se se pretender captar passageiros fora das fronteiras nacionais, esse aeroporto deveria ficar no Norte do País. Portanto, a escolha da localização desse hub nos arredores de Lisboa é uma opção política. E é uma opção política tributária do centralismo acéfalo que há séculos tem tolhido o desenvolvimento do País.
Além disso, há seguramente outras opções para estudar nos arredores de Lisboa. Admitindo que Rio Frio e o Montijo tem problemas inultrapassáveis do ponto de vista ambiental, basta ir ao Google Earth para perceber que quer o aproveitamento de outros aeroportos já existentes, como Alverca (se a Portela teoricamente tinha capacidade para outra pista, não me digam que o alinhamento de Alverca não permite o recurso a essa segunda pista; se vão movimentar todas as terras que vão movimentar na Ota, porque não o hão-de fazer em Alverca?), caso se opte pelo modelo de preferência pelas acessibilidades (multipolares, diversificadas e ponto a ponto) do País ao exterior por via aérea, quer o campo de tiro de Alcochete, caso se insista na ideia de um hub na zona de Lisboa, são alternativas que devem ser explicadas, mesmo se forem preteridas.
Para mim, nesta matéria, o argumento decisivo é o da falta de ponderação de outras alternativas fora dos arredores de Lisboa. É este tipo de cegueira que tem impedido o País de encontrar as melhores soluções e de se preparar para o futuro que já começamos a viver nalguns recantos do mundo. Pegando exclusivamente nos argumentos avançados pelos estudos que o Governo já deu a conhecer, percebe-se rapidamente que os mesmos argumentos são tanto mais válidos quanto mais a norte to País sejam aplicados. Mais, a localização desse hub internacional a Norte até poderia servir para tornar mais lógico o investimento no TGV entre Lisboa e o Norte. Infelizmente, para fazer este tipo de raciocínios é preciso pensar no País como um todo e não como uma mera dependência do Terreiro do Paço e seus priviligiados ocupantes.
Infelizmente, a oposição não tem capacidade para mais do que se opor. Nunca ouvi ninguém, e tenho-me esforçado bastante, na oposição propor qualquer alternativa. Mas existem, por muito que as oposições passem a defender a Ota sempre que chegam ao Governo.
Pior, nunca vi ninguém explicar qual é a política de transportes aéreos que justifica que Portugal se pretenda imiscuir nessa guerra dos hubs intercontinentais. É uma guerra caríssima, que os especialistas em aviação não estão convencidos que seja justificada; muitos deles entendem que no futuro a maioria dos voos, mesmo intercontinentais, se processarão ponto a ponto. Portugal tem uma localização excentrica, para ser simpático. Se o objectivo é colocar Portugal no mapa, se é criar condições de competitividade e concorrência internacional, é ABSOLUTAMENTE IMPRESCINDÍVEL perceber que visão, que política de transportes está por trás da imprescindibilidade de se apostar uma parcela significativa dos recursos de investimento do País nas próximas décadas, num projecto que é economicamente discutível - se não fosse, certamente que já teriam aparecido operadores internacionais de aeroportos interessados na construção desse aeroporto, sem precisarem de garantias do Estado.
Porém, em minha opinião, o que mais me choca é o silêncio do resto do País nesta questão. Afinal, foi preciso a Câmara de Lisboa questionar a Ota para que o assunto ganhasse actualidade política. Foi necessária toda a incapacidade da oposição para se opor a este Governo, para o PSD tirar este coelho da cartola... Se nós todos aceitamos este tipo de decisões sem dar-mos a entender o nosso descontentamento, não podemos depois legitimamente queixarmo-nos das suas consequências.
Acordem, caros concidadãos, já é tempo de pararmos de deixar que nos tomem por parvos!
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