Agora que Bento XVI viaja pela Turquia e assume um claro apoio político à Adesão à U.E., ficam-nos certas inquietações.
A Turquia, enquanto encruzilhada de culturas e costumes, ergue-se sob o símbolo do crescente. Depositária dos despojos do Império Otomano, é com Atartuk que se ergue como país de charneira entre a racional Europa e o Islâmico Médio Oriente.
No livro, já aqui por diversas vezes citado, “A Ideia de Europa”, a unidade idiossincrática constituída pelas diversas culturas que constituem o nosso continente, é sagaz e inspiradoramente definida. E o contraste com o país da velha cidade de Tróia, é uma evidência ofuscante. Por isso, tenho também, para mim, que nas polis dos cafés, nos caminhos dos peregrinos, que vão percorrendo as diversas paragens - qual jogo da glória – nas vetustas pedras das catedrais e das capitais, nos boulevards ou nos parks, nos museus, ao som de uma valsa ou de uma polka nos moullins de la gallette saboreando uma sacher törte, ou assistindo a umas Bodas de Fígaro, nas bibliotecas riquíssimas, das escolásticas universidades ou nos incunábulos dos conventos, há lugar para tudo, há lugar para todos. Todavia, não existe espaço para uma coisa, para a falta de Liberdade!
A alma mater da Europa e do Ocidente é o livre pensamento. O espartilho da razão, em nome do que quer que seja, não tem, pois, cabimento.
Por isso, a União Europeia ao estender as suas fronteiras, absorvendo as culturas que compõem o mosaico e a Babel que é Europa, não correrá, nunca, um grande risco. As línguas podem ser diferentes, mas a seiva que as alimenta provém da mesma cepa.
O grande salto não está em chegar quase até aos Urais, mas em passar esse mar feito rio que é o estreito Bósforo. E não é só um problema de Fé, é um problema de idiossincrasias. Que se reflecte na simples ausência do espírito humanista e universalista.
Contudo, num Mundo em plena globalização. Num Futuro que esbaterá fronteiras, que aproximará culturas, que fará surgir novas potências e novos protagonistas, numa época em que as escalas serão quase inumanas, faz sentido arriscar. E arriscar é criar pontes e dialogar com quem está ao nosso lado.
Donde, de um ponto de vista geo-estratégico, faz todo o sentido que a União Europeia olhe para a Turquia como uma possibilidade. Possibilidade de uma virtualidade para o progresso e para o desenvolvimento. A Turquia é e seria, por natureza, um interlocutor privilegiado com todo o Mundo Islâmico. Não só pela proximidade geográfica, mas porque a Turquia também é Istambul. A cidade que um istmo de mar separa e divide. A cidade que aparta e une dois continentes. A cidade que funde dois mundos, onde uma Mesquita já foi Igreja, e que agora a ostenta como símbolo, só para puro deleite dos sentidos. Sábia sageza esta, a desta cidade. Onde um mar, que de tão estreito, serve de laço e se transforma numa esperança para o diálogo, como pedra angular de uma possível articulação entre Ocidente e Oriente.
Aliás, a Turquia será um poderoso tubo de ensaio e a sua putativa adesão, poderá desencadear, nos países circundantes uma interessante energia. É evidente que as teorias do dominó, sabe-se à saciedade, estão por demonstrar. No entanto, ninguém vai enxertar, em ramo seco, uma sociedade como a nossa. Vai-se apostar num projecto de convergência recíproca, de aproximação voluntária e de acolhimento mútuo. Seja no campo económico, político ou cultural. Onde, de resto, já tem consistentes provas dadas.
A Turquia, na sua contingência específica, como lugar limite, onde coexiste toda a nossa alteridade, mas toda a nossa semelhança, deverá ser um grande desafio, a grande aposta para a Europa, na concretização do seu maior fundamento, ao materializar uma possibilidade real para a Paz.
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