quinta-feira, julho 27, 2006

O doce de amora

Está a chegar Agosto, e com ele as recordações das férias da minha infância, as que passava com os meus irmãos, primos e amigos.
Dormia-se em todo o lado, dois por cama (camas grandes aquelas), uns em colchões no chão, e outros que ninguém sabia bem onde dormiam, se no sótão, se na sala do piano, ou mesmo se dormiam. Éramos muitos, muitos mesmo.
A nossa piscina era um tanque que limpávamos no princípio da época, grandes banhos tomei naquela água gelada com girinos e todo o tipo de minúsculos animais de que já não me lembro o nome.
A praia não era conhecida (felizmente) e na maioria das vezes éramos os únicos a frequentá-la. Não havia instalações de verão, e a única actividade da beach, era mesmo não fazer nada.
Com a total liberdade que tínhamos, podíamos fazer o que nos desse na real gana, sabendo que havia regras para cumprir, como fazer a cama, por e levantar a mesa, e deixar as salas sem areia.
Era o nosso mundo, não havia festas nem preocupações de agenda, as semanas corriam maravilhosamente pelo verão adentro.
Tirando de vez em quando os jantares no Hotel, em que se tinha de por calças e cumprimentar os médicos das termas e dezenas de velhinhas a cair da tripeça, tudo era descontracção e liberdade.
Se tínhamos fome e estávamos no meio do campo, comíamos o que houvesse por perto:
Maçãs, laranjas, tomates, uvas, pêssegos, tangerinas (ai as tangerinas), e amoras.
É precisamente das amoras que vos quero falar.
O doce de amora feito pela minha Mãe, que me desculpem os leitores, era o melhor doce de amora do mundo. As minhas Irmãs também o fazem razoavelmente bem, mas nada se compara com aquele doce, que juntamente com o de geleia de casca de maçã há-de ficar para sempre na minha memória.
E não era um doce qualquer, porque nós também tínhamos a nossa quota parte no sucesso do mesmo, porque fosse junto ás valas ou ao pé das macieiras, não havia amora que escapasse às nossas mãos.
Todos os anos, sempre o mesmo ritual. Que saudades, meu Deus.
E havia amoras magníficas, como as que ficavam na encosta junto das videiras, eram soberbas, grandes e selvagens. Que pena já ninguém as apanhar.
Não havia bolicaos, nem cereais embalados, nem sumos 100% naturais em embalagens hermeticamente fechadas, havia o que havia e pronto.
À noite pedíamos ao nosso amigo Zé da padaria, que como o nome indica era filho do padeiro, que pusesse uns chouriços no meio dos pães enquanto eles iam ao forno de lenha.
Ainda hoje não consigo perceber como os é que os nossos estômagos aguentavam dormir com os pães ainda a fermentar, e no dia seguinte ao pequeno-almoço come-los com o doce de amora.

Só queria um bocadinho desse doce, de me deitar na eira a olhar o céu, e ouvir a minha Mãe chamar-me.

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