Após uma prolongada ausência que seria fastidioso explicar, mas que numa palavra justificaria com falta de tempo, eis-me de regresso a este convívio de ideias. E por muito boas razões.
Quase por acaso, tive ontem a oportunidade de me encontrar em casa de um velho (de longa data, entenda-se) amigo, com um grupo de gente bem intencionada e disposta a incomodar-se para tentar impedir o que alguns se empenham em tornar inevitável: o obsoletismo do partido que no nosso burgo representa a democracia cristã.
Foi muito salutar.
Porém, não consigo evitar a sensação de que é preciso ir mais longe. Infelizmente, todos nós temos memória recente do que pode destruir o empenho de alguns em brincar à política. Tenho para mim que a política é a mais nobre das actividades humanas, justamente na medida em que é o exercício da procura das melhores soluções para os problemas comuns, ou seja, daqueles que nos afectam como comunidade.
Também nessa medida e justamente porque longos milénios de experiências nos ensinaram que a democracia era a única forma de assegurar alternativas de projectos de poder e a alternância desses projectos no poder sem necessidade de revoluções - valor que deveria ser decisivo para quem se afirma de direita - os partidos revestem um papel fundamental nas sociedades ocidentais a que, contra todas as evidências e apesar de tudo, Portugal pertence.
Seria por isso natural que os partidos fossem os primeiros berços desses projectos de poder e que os congressos dos mesmos partidos fossem os encontros em que, naturalmente, esses projectos de poder se debateriam e criariam, antes de serem propostos ao País.
Porém, verificamos mais uma vez que o nosso partido se encontra enredado numa luta de poder muito mais primária. Não estão em causa projectos de poder - do verdadeiro, daquele que se assume para governar ou transformar um país e a sua sociedade; não, o que está em causa são opiniões do líder sobre os soldados e opiniões dos soldados sobre o líder e a sua estratégia.
Infelizmente, parece ter-se perdido a noção de que os partidos, como todas as outras organizações institucionalizadas da sociedade, tem órgãos próprios precisamente para que as diferenças de opinião DENTRO DE UM MESMO PROJECTO possam ser expressas sem se pôr em causa a coerência e o apelo da sua proposta. De modo que até nem espanta que se esteja a preparar um congresso em que uns vão tentar esclarecer as condições em que poderão prosseguir o desenvolvimento do próprio projecto e outros vão procurar provar que não era necessário realizar esse congresso porque aquelas condições não se discutem.
Naturalmente, cada um tem as suas próprias ideias e os seus próprios interesses para proteger com essas posições. O drama é que quer umas quer outros são indizíveis em voz alta e vão acabar por constituir o espectáculo principal do congresso, se não fizermos nada para o impedir.
Creio que podemos resumir a presente situação assim: o actual líder não pediu para o ser, mas aceitou-o como consequência natural de ter uma opinião sobre um projecto de poder para o partido, num momento em que os outros eventuais projectos de poder não se quiseram ou não souberam assumir. Aceitou-o em circunstâncias claramente adversas, quer interna quer externamente. Por outro lado, o verdadeiro líder moral do partido não quer ou não pode ainda dar a cara pelo seu projecto de poder, aquele que os militantes e os simpatizantes verdadeiramente desejam conhecer. As exigências da primazia do marketing político assim o parecem determinar.
Concluo que só há dois verdadeiros interlocutores de quem quer que se queira disponibilizar para investir tempo no próximo congresso do partido: os Drs. Ribeiro e Castro e Paulo Portas. São eles que tem obrigação moral de defender os dois lados do que está em causa. O primeiro para confirmar, ou não, as condições mínimas para desenvolver o seu projecto. O segundo para assegurar condições para poder vir a defender o seu projecto em tempo que julgue oportuno, sem que antes o partido se autodestrua.
Caso contrário, uma vez mais, o partido demonstrará ao país que está mais preocupado com o folclore político de dar bicadas nos adversários e bicas aos amigos, do que em desenvolver projectos de poder alternativos ao poder actual. Não é preciso puxar pela memória para nos lembrar-mos das consequências que esse espectáctulo inevitavelmente terá. Além de que, folclore por folclore, prefiro o que tem música... sempre dá para dançar.
PS- Infelizmente não poderei defender o que aqui afirmo de viva voz, no congresso. Mas sei que há boa gente atenta e interessada em garantir que o congresso se ocupa do que deve: o projecto de poder alternativo da democracia cristã. O País precisa disso e o nosso futuro também.
Sem comentários:
Enviar um comentário