quinta-feira, abril 07, 2005

Porquê?

Entram-nos em casa, diariamente, impressionantes imagens das torrentes de peregrinos que aos milhões, acorrem a despedirem-se de João Paulo II. Estou certo que são uma das expressões que a sua morte provocou. Outras haverá, seguramente, mais recolhidas e introspectivas. Mas, ninguém o porá em causa, todas genuínas, porque voluntariosamente voluntárias.
A maior opus do Papa, maior que qualquer uma das suas encíclicas, foi, indubitavelmente, o seu magistério estribado na Palavra e no exemplo ímpar de Cristo. Foi um intérprete raro e maior de uma mensagem com dois mil anos.
Tenho para mim que a matriz fundadora do seu exemplo começou no início do seu pontificado quando profere as palavras de S. Marcos: “não tenhais medo”. Encerrando neste “medo” todas as angústias, inquietudes e receios da Humanidade. Foi, assim, derrubando barreiras e muros – como já alguém disse – redefinindo fronteiras. Vimo-lo correr o Mundo, sempre, como peregrino incansável. Depois, auscultou os ventos de mudança vindos do ocaso do milénio e aí reconheceu o verdadeiro desafio do seu apostolado: a falta de Fé e de Esperança. Enquanto isso a debilidade física já o ia vergando. Mas nele sempre a dor soçobrou, amparado no báculo cruciforme da Fé. As multidões, emocionadas, iam-no sempre acolhendo. Sem nunca vacilar. Até que, a inquebrantável determinação, teve a catarse, nos tempos vespertinos da sua morte.
Esse foi o grande e derradeiro teste. A prova final, a casa da glória do romeiro. Firme e fiel. Ao ousar mostrar a sua doença, a sua velhice. Ao não esconder que piorava dia a dia. Sempre empenhado em servir. Levando ao limite as suas forças. Para dar o exemplo. E todos sabemos – como? – que não vacilou na hora em que partiu.
É este paradigma de coragem perante o limiar da vida que justifica, na sua plenitude, a sua frase primeira : “Não tenhais medo”. O último dos medos: o da própria morte!!!
O seu testemunho dá-nos, pois, a certeza da Esperança, e inspira-nos, intuitivamente, na busca do seu exemplo.
Num tempo em que as referências se esvaem, em que tudo é subjectivamente relativo, há um modelo que permanece. Como Sócrates - derrubando o mundo sofista em que o homem era a medida de todas as coisas - que podendo fugir da prisão preferiu beber o copo de cicuta. E morreu para revelar a sua palavra com ainda mais força.
Agora, em que o diletantismo de Kierkgaard, o niilismo de Nietzsche, o relativismo de Bachelard ou o existencialismo de Sartre nos confundem, ilumina-nos o poderoso testemunho de um homem. Que no fundo de nós próprios reverbera. E, assim, se manifesta e revela como, verdadeiramente, transcendente. E comovedor!!!

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