O meu truque

Sei que muito boa gente se arripia ao assistir áqueles debates parlamentares, com o actual Governo alinhado em arco e a Assembleia a fervilhar.

Pois a mim entretenhem-me. O meu truque é o seguinte:

Parto do princípio que aquilo não é o Governo, nem o Sócrates o seu chefe-inteligente.
Olho para eles e digo-me que são concerteza os rotários de Atafona e tento descobrir qual deles é a D. Teresinha da farmácia, qual o Conservador do registo predial e em que cadeira se senta o advogado que na semana passada safou aquele mafarrico do Nelo com um discurso sobre a miséria humana que até pôs a Vitalina a chorar.

Ou então digo-me que aquele bando é a agremiação de bombeiros de Ficalho, a prestar contas sobre o exercício anterior e a prometerem pneus novos para a ambulância e que hão-de trazer o Angélico para a festa da Senhora das Agonias.

Num dos mais recentes debates, percebi que este Governo era a direcção de um desses clubes “os Últimos da Liga”. E lá estava o Sr. Lino, o barbeiro, a explicar que isso dos sócios acumularem calotes no bar é uma vergonha: “Beberetes à borla, só nas auto-estradas, ai o camandro!”.
O inteligente-chefe , em estilo de remate da sessão e naquele tom positivo-voluntarista que aprendeu no Reader’s Digest, anuncia ufano que já tem apalavrado um moço muito jeitoso, um médio/libero/ponta de lança muito promissor , que além de ser muito bom a defesa esquerdo, há-de ter lugar assegurado na baliza .

Mas há sempre insatisfeitos, há sempre uns ingratos: ouve-se uma voz do contra a perguntar insidiosa, desrespeitosa e, pior ainda, insultuosamente: “Você está a falar do Casimiro? Ora bolas, isso é uma fraude e sou eu que o digo. O Mirito anda com um pé ao peito há mais de meio ano e tens as unhas encravadas. É uma vergonha e uma desfaçatez o senhor vir para aqui prometer-nos uma porcaria dessas”.

Ao que o chefe se agiganta e, sorrindo para o Papageno do lado, brota esta estocada mortal:
“O senhor é um ressabiado, eu já lhe conheço o ranger de dentes. Face a esta crise do clube, importada e importante, o que é que o senhor tem a propôr? Nada, absolutamente nada, apenas imobilismo, puro imobilismo. Pois eu vou trazer-vos o Casimiro e havemos de ganhar a Taça”.

Olarilolé!

douro