terça-feira, setembro 09, 2008

Quem disse que a "silly season" ainda não tinha acabado? - II

Dei por mim, incrédulo, a ler as seguintes citações sobre as eleições angolanas, escritas pela pluma caprichosa - a Clara Ferreira Alves não tem nada a ver com isto - de um dos mais distintos professores de Direito Constitucional e com jurisprudência feita no Tribunal homónimo:

"Poucas eleições africanas em ambiente democrático terão sido disputadas com tanta liberdade, pluralismo e transparência como estas eleições angolanas".
Pergunto-me se não haverá um outro país chamado Angola, porque no que conheço, tais expressões nem quimeras chegam a ser....
Depois aventa uma explicação para o plebiscito angolano, redobrando o valor da vitória do MPLA: "Não é difícil perceber por que é que o resultado não poderia ter sido muito diferente, ainda que o MPLA não beneficiasse das vantagens de deter o poder, tanto nas instituições como nos media públicos". Aqui houve algum pudor ao reconhecer que, na verdade, o MPLA não detém o poder das instituições.... ele é o poder.
Espantou-me, igualmente, o conceito de que a redistribuição da riqueza angolana se faz de forma equitativa :" o elevado crescimento económico que começa a beneficiar, ainda que de forma incipiente, camadas cada vez mais largas da população". Estranho, porém, que Angola ainda seja um dos países com um dos índices de desenvolvimento humano mais baixos do Mundo (só para se ter uma ideia, a média de esperança de vida não ultrapassa os 41,7 anos). Porque será então...?
Mais estranho ainda é o facto de o próprio escriba, que tem todas as vocações menos a de oráculo, arrisque adiantar, até, o resultado das eleições presidenciais, que terão lugar para o ano: "Se é lícito tirar ilações das eleições parlamentares, então parece fácil antecipar que o candidato do MPLA ganhará as eleições presidenciais sem grande dificuldade, sobretudo se ele for José Eduardo dos Santos." . Previsões destas até uma criancinha bi-dente. Não lhe ocorrerá que, se calhar, repito, se calhar, tanta certeza é de estranhar. E o mais curioso é que o próprio plumativo parece reconhecer o vício: "Aliás, a vitória do MPLA nas eleições parlamentares deveu uma parte da sua grande expressão ao próprio Presidente".
Mas quando, finalmente, uma centelha de bom senso parece iluminar a cegueira do articulista, eis que reincide e reitera as suas certezas afirmando que "Com instituições democraticamente legitimadas de forma insofismável ..." .
No final, belisquei-me. Fechei o jornal. Abri-o novamente, na secreta esperança de ter lido um artigo sobre a Noruega. Afinal o petróleo era mesmo Angolano.
Para quem se quiser deliciar com a citada pérola negra, leia o artigo de Vital Moreira, hoje no Público. Não disponível online.

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