quinta-feira, abril 24, 2008

Direita e partidos

Não tenho tido muito tempo para dedicar a notícias, mas as coisas andam animadas, pelo lado do PSD. Ouvi, por coincidência, o politólogo Joaquim Aguiar, no Prós e Contras de 2ª feira, descrever com muita lucidez o que se passa no centrão político nacional. De forma simplificada, reduzia o problema à falta de apetência do eleitorado português por soluções liberais, que considerou de centro direita. Pelas mesmas razões, reconhecia que o PS se via "forçado" a políticas liberais, visto que era disso que a sociedade necessita. Nestes termos, o PSD estaria praticamente condenado a desaparecer. Não o quiz dizer, pelo que falou de "refundação", ou melhor, da necessidade de refundação dos dois partidos, PS e PSD. Logicamente, neste tipo de análise, o CDS estaria condenado a representar o papel do PC, à direita; uma espécie de limite seguro do regime "legítimo" - note-se que não disse isto, o politólogo, mas é o que decorre de quanto disse.

Penso que ficou por dizer o mais importante, embora muita gente, agora, fale disso com outros nomes. O PPD/PSD sempre foi uma máquina sebastianista, no sentido em que se construiu para suportar um homem que muitos consideraram maior que o País - e que, apesar das poucas provas, a memória mitificou pelas circunstâncias da sua morte. Sá Carneiro deu o mote. O partido que passou por uma fase de implosão, em virtude de não conseguir imediatamente encontrar substituto, reencontrou-se consigo próprio quando Cavaco precisou de fazer a rodagem ao carro. É que Cavaco era líder, tal como Sá Carneiro era líder. Ambos eram líderes solitários, incapazes de partilhar a condição de chefia, de norteador de um rumo. O PSD reconheceu-lhes esse estatuto e o país agradeceu.

Pelo caminho, sacrificou-se um pequeno pormenor: o PSD não tinha projecto. Ou melhor, perdeu o projecto. Inicialmente, o projecto era claro e consensual: reverter ou pelo menos limitar os excessos do pós-25 de Abril, muitos deles constitucionais. Esgotado esse "projecto", em grande parte, o PSD bastou-se com a preocupação cavaquista de não desbaratar os fundos europeus. Que resultou, tal como conhecemos, com todas as virtudes e defeitos que agora se comentam.

Entretanto, a perda do projecto foi disfarçada pela vontade de exercer o poder, com todas as mordomias que isso acarreta - em particular nas benesses a colher após o exercício governativo; qualquer análise simplista dos percursos de ex-ministros e ex-secretários de estado é elucidativo. Pago a quem me apresentar algum que não tenha melhorado substancialmente de nível de vida, com a passagem pelo governo. Pior, porém, é que essa forma de exercício do poder tendeu a generalizar-se; de repente todos os ambiciosos do País queriam dar o salto, via passagem pelo poder. Em todos os partidos. Não será exagero reconhecer o ponto a que chegamos, no segundo governo Guterres. Nem o erro em que o CDS caiu ao pensar que poderia colher louros significativos pela mera passagem pelo poder - com resultados à vista, e com sacrifício de um eventual projecto que ainda pudesse existir então no próprio CDS.

Chegados onde agora estamos, a ausência de projecto do PSD assume foros dramáticos. O problema é que o PSD também não tem muitos líderes, no sentido originalmente apontado, disponíveis. Tanto quanto vejo, identifico apenas dois: Alberto João Jardim e Pedro Passos Coelho.

O primeiro, porque apesar do provincianismo saloio das elites da corte (Terreiro do Paço), é um homem desassombrado e de obra feita, que apela claramente ao eleitorado e sobretudo aos militantes do PSD que estão cansados da falta de líder - que, de certa forma, lhes revela a inutilidade do partido, a não ser como máquina do poder ao serviço de muito poucos.

Pedro Passos Coelho parece-me um caso mais sério. Além de ameaçar ter projecto, fala como um chefe. E manifesta vontade de trabalhar no único terreno que resta à direita: o da alteração do discurso público. Por último, mas não menos importante, representa sangue novo (os outros já se governaram, é preciso dar tempo aos novos).

Assim, para além do descontentamento das massas que não é um exclusivo do PSD, parece-me que a escolha se fará entre estas duas alternativas. Manuela Ferreira Leite não é mais do que uma tentativa das elites para sossegar o partido. A não ser que nos reserve grandes surpresas, o que é pouco provável, não o conseguirá, visto que o descontentamento é mais profundo. As pessoas não acreditam que MFL possa fazer pontes mais baratas do que o primeiro-ministro, nem que baixe impostos mais depressa. É preciso sonhar.

Se por acaso o PSD apostar em Pedro Passos Coelho, a questão da necessidade do CDS vai-se colocar com grande acuidade. Receio bem que na ausência de um projecto alternativo sólido, a resposta venha a ser desfavorável ao CDS actual.

Reflexões com que termino a minha tese.

É possível um Portugal melhor. Basta querer.

PS. Em 1995, no congresso do Pavilhão Carlos Lopes, consegui incluir na moção da JP, que venceu o congresso, a minha própria moção que propunha a realização de uma Convenção Nacional para Refundação da Direita. Diz o povo que ninguém é profeta na sua própria terra.

6 comentários:

  1. Muito bem , meu caro. Muito bem.
    Abraços

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  2. Bonitas e fundadas palavras, como de costume, caro Ventanias !
    No entanto, julgo que a teoria que aplicas ao PSD é extensível a todos os partidos de poder. Quando o aparelho do partido sente que um determinado lider, não os vai levar de novo ao poder, trata logo de o pôr com dono.
    Quanto à passagem do CDS pelo governo, ela foi nitidamente positiva para o partido. A imagem do CDS, ganhou notoriedade e credibilidade durante o governo de coligação PSD/CDS. O pior, é que tudo isso foi desbaratado com o inacreditável comportamento que Portas e sus muchachos tiveram com Ribeiro e Castro.

    Carlos de Maia

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  3. Tens razão, meu caro Carlos.

    De facto, tudo o que se passou depois tende a fazer-nos esquecer os bons resultados que o CDS estava a conseguir até ao abandono de Durão Barroso...

    É história.

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  4. Ventanias

    Sabias que o Tribunal da Feira foi evacuado e encerrado porque estava em risco de derrocada?

    Se o que está em risco de derrocada política também tem de fechar, já não vai haver tempo para a profetizada Convenção...

    Um abraço

    JAC

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Muito em voga estão as comparações transatlânticas, futilmente poderíamos comparar Pedro Passos a um Obama social-democrata. Já Ferreira leite só a muito custo se poderia comparar com H. Clinton.

    Já uma eventual candidatura de Jardim, veria como um joker eleitoral no sentido mais circense.

    Abraço
    RMP

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