Foi assunto nacional a questão do anonimato dos financiadores do estudo da CIP sobre Alcochete. Desta vez, estou em crer, alguns bons pensadores nacionais prestaram um mau serviço ao País.
Primeiro: A CIP é uma entidade credível, que tem toda a legitimidade para defender os seus interesses, nomeadamente junto do Poder (Governo e Presidência), igualmente em matérias de interesse económico, em particular se tiverem impacto significativo na capacidade de investimento do País, como é o caso do futuro aeroporto de Lisboa. A CIP, enquanto promotora do estudo, é a sua autora moral. O modo como se financiou, desde que legal, é legítimo e irrelevante.
Segundo: os autores do estudo são credíveis. Além do mais, limitaram-se a explicar com clareza e fundamentos técnicos o que qualquer leigo interessado já tinha percebido.
Terceiro: a transparência é um valor decisivo, numa democracia que funcione. Mas não é um valor absoluto. Passo a explicar.
Que a CIP e os seus financiadores decidam manter no anonimato a sua identidade, parece-me completamente legítimo e totalmente secundário em relação ao que estava em causa; um estudo sério, realizado por autoridades independentes sobre uma questão da maior relevância. O Povo não precisa de saber quem o pagou, apenas precisa de saber o que diz e se o que diz faz sentido. E, caso faça, ao Povo interessará conhecer e avaliar as decisões que o Poder venha a tomar nesta matéria, tendo ou não em consideração o conteúdo do referido estudo.
Por outro lado, existe um interesse público relativo à decisão de anonimato. Do ponto de vista da opinião pública, é importante saber se o anonimato foi só para o grande público ou igualmente para o Poder. Isto é, interessa saber se o Governo e a Presidência conhecem a identidade dos financiadores ou não.
Se sim, é relevante saber que o Poder sabe coisas que os autores não querem revelar ao público. O que nos pode levar a suspeitar de interesses obscuros por trás do dito financiamento.
Se não, é legítimo e deve ser aceite que quem não se quer identificar ao Poder decida também não se identificar ao Público. Não está em causa qualquer relevante interesse que mereça ser protegido; afinal, esses benfeitores anónimos limitaram-se a proporcionar um bem "absoluto": mais informação relevante para a tomada de uma decisão importante.
O resto, é conversa para distrair o Público e vender jornais. Mesmo em nome da transparência. Mesmo que a caridade desses quantos anónimos tenha por destinatário este tão mal tratado nosso País.
Infelizmente, é com atoardas destas que alguma da nossa elite, porventura bem intencionada, vai fazendo mal ao País. A troco de se defender a "transparência", aparentemente, põe-se em causa a bondade de um "bem absoluto", a divulgação de mais informação relevante, para se procurar reduzir a questão a um "mero jogo de interesses"; ainda por cima, com o opóbrio de não serem interesses "transparentes"...
Muitas vezes, é em detalhes destes que se ultrapassa a fronteira entre informar e comentar. Como a nossa imprensa não tem capacidade para discernir essa fronteira, caberia aos comentadores, em especial os de elite, discernirem o que está em causa e colocar a coisa nos seus termos correctos.
Infelizmente, não foi o que se passou neste triste episódio.
Felizmente, os financiadores que entretanto se deram a conhecer já permitiram perceber que não terá sido por "interesses obscuros" que se deixaram motivar para a causa. Pena foi que o tenham decidido fazer em nome de uma falsa questão...
É possível um Portugal melhor. Basta querer.
Muito bom! Na Mouche!
ResponderEliminarDiscordo em absoluto, Pedro Menezes Simões.
ResponderEliminarNa mouche foi o artigo de ontem de Vasco Pulido Valente.
O que esta história revela, o que as declarações de Francisco Van Zeller revelam é a absoluta inviabilidade de um modelo liberal em Portugal. Essa ficção a que, por vezes se chama "classe empresarial portuguesa" vive e sobrevive - como as não sei quantas centenas de milhares de funcionários - sem risco à custa do Estado e dos governos. Importa, por isso, não ofender o poder político e, se acaso se tem que manifestar qualquer discordância, há que o fazer embuçado e anónimo, não vá o poder exercer retaliações.
É uma triste história, esta da CIP. A expor de forma tão flagrante o modo como a pretensa elite privada vive de cócoras diante de qualquer ministro, como o mais humilde contínuo de um reles serviço público.
Uma triste história.
Centenas de milhar, deve ler-se no meu comentário anterior.
ResponderEliminarCaro Funes, tem toda a razão.
ResponderEliminarAliás, já o tinha dito aqui:
http://norteamos.blogspot.com/2007/06/covardia.html