Se há assunto que em Portugal deveria merecer um pacto de regime era o da educação. Por todas as razões, mas sobretudo porque o sistema não está a preparar Portugal para o futuro. Não duvido que se aproximam tempos de grandes mudanças, quer por dificuldades orçamentais, quer porque o resto do mundo não pára e a classe dirigente, pelo menos, está consciente da necessidade de se fazer alguma coisa, quer porque os resultados que o sistema actual tem permitido são manifestamente insuficientes e tristemente desapontantes, sobretudo quando se tem em conta que o problema não é o que se gasta com educação; é a forma como se gasta.
Num contexto sobre o qual julgo existir um consenso nacional sobre a necessidade de mudar, ainda que ninguém apresente ideias, pelo menos claras, sobre os caminhos dessa mudança, não pode deixar de surpreender e inquietar a repentina boa-vontade sindical de encontrar uma plataforma de entendimento para combater as reformas que irão ser propostas. Com franqueza, vir hoje em dia afirmar que é preciso defender o estatuto dos professores que se não produziu, pelo menos contribuiu, aproveitou e não impediu o actual estado da educação, não pode querer dizer coisa boa.
Se ainda por cima todos os representantes corporativos - porque hoje em dia os sindicatos não são mais do isso, infelizmente - se mostram de acordo em combater o que ainda não conhecem, quase só por uma questão de princípio, ficamos todos imediatamente esclarecidos sobre a bondade das suas intenções e sobre a profundidade da sua consciência sobre a desgraça da situação.
Perante tamanha monstruosidade, seria desejável que os partidos políticos, em especial os que se reclamam do "arco da governação" se empenhassem em encontrar uma plataforma de entendimento, qualquer uma, que apontasse linhas de reforma e objectivos a alcançar. Por uma única razão: porque é urgente alargar a base de legitimidade que permita aos decisores enfrentar uma contestação que se anuncia acesa.
Faço votos para que as pessoas com responsabilidade sejam capazes de as assumir e pôr os interesses do País à frente de chicanas políticas que nem votos rendem...
Pela minha parte não teria problemas nenhuns em aproveitar todas as reformas que, ainda que imperfeitamente:
1)- responsabilizem os pais pelo comportamento dos filhos nas escolas e pelos resultados globais dum percurso escolar típico;
2)- responsabilizem os professores pela condução técnica do processo educativo - não compete aos pais discutir como é que se ensina, nem se deve haver deveres ou não e muito menos se o filho adquiriu competências para passar de ano; compete-lhes criar condições para que os filhos cumpram e aproveitem os métodos do professor e da escola;
3)- distingam os professores pelo mérito, avaliados da única forma razoável: os resultados da preparação dos alunos para os exames nacionais, através dos resultados que estes alcancem nesses mesmos exames;
4)- terminem com essa praga das colocações centralizadas de professores e devolvam às escolas, ou às autarquias locais ou a qualquer outro mecanismo de legitimidade local e de proximidade existencial, o poder de decidir da contratação dos professores; envolvendo os pais, naturalmente;
5)- devolvam os alunos à sua função principal de educandos; a escola é o local onde se aprende, não por diversão nem muito menos para libertar os pais para os respectivos trabalhos, mas porque no mundo actual quem não sabe não encontra saídas profissionais que o satisfaçam - o que, em certo sentido, é pior do que não ver - e o saber, até que se invente um método melhor, adquire-se na escola;
6)- ocupem o excesso de professores na criação de condições para que os mais desfavorecidos não se vejam prejudicados no sistema - aulas extra, apoio de estudo, ocupação de tempos livres, enfim tudo o que garanta a libertação da falta de condições dos pais;
7)- destruam os aparelhos centrais e centralizados de colocação e promoção, ou até mesmo de formação de professores, que pouco mais servem doque para o enriquecimento do eduquês e para o jogo de influências em que o centrão se especializou tão notavelmente;
8)- libertem os recursos daí resultantes para a melhoria das instalações das escolas e para assegurar o acesso a quem fique mais longe das futuras escolas mais esparsas;
9)- rentabilizem as melhores cabeças dos nossos alunos, proporcionando-lhes classes avançadas que os estimulem a avançar para essa tão propalada sociedade do conhecimento que aí vem; rentabilizem as piores cabeças fornecendo-lhes uma arte ou um ofício e preparando-as para uma sociedade onde aprender é uma das componentes essenciais da vida; rentabilizem os outros, os normais, os que se preparam para se especializarem em estudos de nível pós-liceal;
10)- permitam descobrir os talentos de cada um dos nossos filhos, seja no desporto, na ciência, na marcenaria ou na matemática, por forma a que o sistema saiba criar pessoas que se sintam úteis e ocupadas.
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