Há uma diferença fundamental nas duas OPA que tem animado o mercado financeiro português. A Sonae, depois de conseguir afirmar-se como um dos maiores grupos empresariais nacionais sem perder independência perante os poderes políticos, escolheu desenvolver-se, na área das comunicações, através da compra do seu principal rival. Sucede que se trata de um rival especial. É uma empresa que foi pública e agora é partidária, muito embora se apresente como uma empresa exemplar e emblemática. É sobretudo um modelo da promiscuidade entre o poder económico e o poder político.
Por isso a OPA da Sonae é boa para o País, ainda que tenham de ser devidamente ponderadas as condições que possam garantir concorrência no sector em Portugal, deve ser autorizada e o Estado deve abster-se de intervir. Talvez assim se crie um verdadeiro centro de decisão nacional, independente dos poderes públicos como devem ser os poderes económicos, capaz de aproveitar todo o potencial do sector sem se prender às mordomias que tanto mal tem feito ao País.
Já o caso do BCP é muito diferente. O BCP foi um exemplo de sucesso, pela estratégia seguida e pelos sucessos alcançados nesse percurso, que depois se vendeu à promiscuidade com o poder político a troco de um projecto de conquista de quota do mercado nacional que muito pouco trouxe de bom quer ao País quer aos seus accionistas. O País perdeu porque o banco não tem uma estrutura acionista estável que o invulnerabilize perante o potencial interesse de outros bancos de maior dimensão internacional. E é mau para o País porque representa uma parcela muito significativa do mercado bancário português que é vulnerável. Não representa nenhum centro nacional de decisão estável. Nem tem sabido utilizar a importante quota do mercado português para ganhar verdadeira dimensão internacional.
Portanto, a OPA do BCP sobre o BPI devia ser chumbada. Porque seria má para a concorrência em Portugal. Porque não traria nada de bom para Portugal. Porque se o BCP quer continuar a crescer que o faça internacionalmente. Mais de 22% do mercado nacional devia ser mais do que suficiente. E porque é importante defender as empresas que não se prostituíram perante o poder político - como, apesar de tudo, foi o caso do BPI. Se a OPA for autorizada, perde o País, perde o seu mercado bancário, perdem os trabalhadores que fiquem desnecessariamente sem emprego e perdem os dois bancos envolvidos, pelo que lhes custará encontrar as tão propaladas sinergias que raramente são óbvias. Que o diga quem conhece a forte cultura empresarial do BPI e quem conheceu a diluição da outrora fortissima cultura do BCP após as multiplas aquisições em que se empenhou.
Que se perceba de uma vez por todas: o capital não tem Pátria. Nem deve ter, se quiser cumprir o seu importante papel no desenvolvimento das economias. Mas o trabalho tem. E a única garantia, a prazo, que os sistemas económicos nacionais podem dar aos trabalhadores de que continuará a haver trabalho é estimularem a concorrência, tanta quanto possível até ser dolorosa. Só assim se criam condições para o capital apátrida escolher o País como destino.
Viva a concorrência, venha de lá a concorrência, tragam mais se souberem quem a há-de trazer. E deixem lá os centrinhos de decisõesinhas ir para o raio que os parta, pelo menos enquanto continuarem a ser centros de emprego partidário.
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