Como não terá escapado aos mais atentos, um dos pontos essenciais das minhas critícas às decisões em matéria de política de transportes do actual governo era a ausência de uma política integrada que tivesse no centro das suas preocupações a importância do transporte de bens e mercadorias e a posição geográfica de Portugal. Paralelamente, o Governo veio anunciar um dos elementos fundamentais de uma tal política, qual seja o das plataformas logísticas.
Sem prejuízo de aqui se reconhecer que este governo, ao contrário dos anteriores, tem vindo a governar, isto é, a fazer escolhas que determinam o futuro dos portugueses actuando no seu presente, ainda assim parece de alertar para o que segue.
Uma vez mais, é o poder central que se vem assumir como motor das transformações do País. Sendo certo que a esse mesmo poder caberá sempre uma função coordenadora das decisões com impacte nacional, não deixa de ser de sublinhar o erro em que tal concepção labora: não faz sentido manter o essencial deste tipo de decisões exclusivamente centralizado em meia dúzia de gabinetes bem pensantes. Mais importante seria destruir o actual sistema decisório e substituí-lo por um outro descentralizado que permitisse aos agentes da mudança, privados ou públicos, responder às oportunidades que se lhe deparam com a flexibilidade que um sistema descentralizado permite e induz. Ainda que tal pudesse conduzir a alguns erros, como é natural para o sector privado, seguramente que aumentaria a capacidade de produzir respostas actuais para problemas actuais e naturalmente que aumentaria a disponibilidade de investimento, na justa medida em que esses agentes sentissem vontade de correr o risco inerente ao posicionamento para aproveitar as referidas oportunidades. Falamos, antes de mais, de uma mudança de mentalidades mais independente do poder político e mais vocacionada para o aproveitamento dos potenciais individuais e colectivos, através do risco e da recompensa.
Mais do que isso. O anúncio do governo abre a porta a um período de decisões e execuções que deveria ser devidamente acompanhado pelas oposições. Quem acompanhe com um mínimo de atenção os desenvolvimentos à escala global do sector dos transportes, tem seguramente a noção das oportunidades que podem constituir para um País na situação geográfica de Portugal. É, antes de mais nada, intuitivo.
Ora, no actual quadro sistémico nacional, o grosso dos investimentos que darão corpo às intenções do governo virão de decisões públicas ou entidades públicas. O risco das oposições não prestarem atenção suficiente a esse fenómeno, e por conseguinte, de não escrutinarem essas decisões e intervenções, denunciando-as quando se justifique, influenciando-as quando for possível e melhorando-as sempre que desejável, esse risco é demasiado sério para que não tenha consequências políticas. Nesta função das oposições, estará em causa, de um lado, a credibilidade do sistema político no seu todo, e dos partidos da oposição em particular, e de outro lado, o aproveitamento dos escassos recursos ao dispor da Nação.
A título de exemplo, sugeriria apenas que o CDS se concentrasse na rentabilidade marginal dos investimentos na via ferroviária. Em bom português, que avaliasse comparativamente os custos de investimentos em linhas de Alta Velocidade, de Velocidade Elevada e de mera modernização de linhas (duplicação, alimentação eléctrica, adaptação de bitolas, intermodalidade), face aos benefícios por euro investido - ainda que ponderando diferentes calendários e horizontes temporais. As surpresas seriam certamente enormes. E as consequentes capacidades de intervenção de alto valor público acrescentado e reconhecido, certamente de igual dimensão.
Nesta lógica, por exemplo, seria de avaliar a relação de custos e benfícios que poderia advir de uma decisão de adiamento da introdução de AV para passageiros (v.g. para 2025), comparada com uma antecipação dos prazos de modernização de linhas essenciais ao transporte internacional de mercadorias e passageiros (já para o final de 2007). É que, intuitivamente, o ganho marginal de uma e outra não é comparável - a não ser por esse critério provinciano do tempo de viagem por km percorrido (que, aliás, é claramente exacerbado nos estudos do governo sobre a AV, pelo menos no que respeita a mercadorias, sobretudo quando antecipa necessidades ainda não verificadas, identificadas como potenciais sem qualquer fundamento e, por isso mesmo, especulativas).
A benefício do País, dos seus transportes, da sua rede ferroviária e do CDS enquanto partido de oposição credível.
Sem comentários:
Enviar um comentário