terça-feira, maio 31, 2005

CONSTITUIÇÃO OU NÃO

A derrota do Tratado constitucional em França, que é, antes de tudo o mais, uma derrota do 'establishment' situacionista, intervencionista e secretista (no sentido de pouco transparente), cria uma oportunidade que não tenho visto devidamente tratada. Na verdade, o actual Tratado não é nem um bom tratado nem uma boa constituição. Pelo contrário, representa mais um momento da pouco esclarecida deriva em que entrou a Europa, União, desde a queda do muro, em grande parte por falta de visão dos seus líderes.

Infelizmente, já não existe uma ideia clara do que é que precisamos de fazer em comum e do que já não chega fazer individualmente. Por outro lado, também não deixa de ser verdade que é difícil negociar coerentemente a 25. Sobretudo quando os Estados fundadores são os primeiros a dar o exemplo da egoistíca visão do que a Europa deve fazer para melhor os servir. Não admira, por conseguinte, que os povos se sintam distantes do processo de construção europeia e que elejam preocupações locais acima dos interesses gerais. Também não surpreende que não percebam que a rejeição do Tratado não resolve os problemas que os levaram a fazer essa escolha.

Por outro lado, é o Tratado possível e institui uma Constituição desejada de um continente que se quer ver unido. Significa, também, mais um passo na direcção do futuro. Organiza melhor a União e simplifica, de algum modo, os processos decisórios. Reequilibra os poderes dos Estados-membros e cria os mecanismos de uma melhor afirmação da Europa na cena internacional. Despido da França e da sua visão chauvinista anti-americana simplista, pode até revestir potencialidades até agora insuspeitadas.

Na verdade, este resultado confina a elite francesa a uma marginalidade que o seu orgulho bacoco não permitia imaginar. E esta é uma oportunidade que os países que não se revêem na reprodução do modelo francês - falo da mundividência, não apenas do modelo político-institucional - devem aproveitar rapidamente, refundando a Europa e recentrando-a naquilo que ela deve ser em primeiro lugar: um instrumento da criação de desenvolvimento e harmonia, em paz, no nosso continente.

Esperemos que haja mentes lúcidas e atentas por essa Europa fora. A começar pela velha Albion, que se deseja perca o medo de referendar pela positiva este Tratado, como um sinal de que a União Europeia não tem donos. Apenas membros interessados na Paz, no Emprego e na Competitividade dos seus Países, Cidadãos e Empresas.

Talvez então a França perceba que a Europa actual já não se esgota nas virtualidades da reconciliação franco-alemã. Talvez então interiorize a necessidade de fazer o trabalho de casa se se quiser reformar para a modernidade. Talvez a Alemanha se liberte da obrigatoriedade de subsidiar o obsoletismo francês. Talvez a Europa se reorganize em torno da necessidade de defesa e promoção de uma civilização de que nos podemos orgulhar.

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